MPF instaura inquérito para apurar regularidade de lotes de armamentos

Projéteis pertencentes à Polícia Federal foram encontrados no local do assassinato de Marielle Franco em 2018 - Foto: Arquivo

Rio de Janeiro
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O Núcleo de Controle Externo da Atividade Policial do Ministério Público Federal (MPF) no Rio de Janeiro instaurou inquérito civil público para apurar a legalidade e regularidade dos procedimentos adotados na distribuição de lotes de armamentos, encaminhados aos órgãos relacionados à atuação na segurança pública.

Para tanto, foram expedidos ofícios à Companhia Brasileira de Cartuchos (CBC), para que explique os motivos do fornecimento do lote CBC nº UZZ18 ter sido distribuído em número extremamente superior ao permitido em regulamentação pertinente à matéria. Foram mais de 1,8 milhão de munições no calibre 9mm, 200 mil só para o Estado do Rio de Janeiro. É desse lote que foram encontrados projéteis no local do assassinato de Marielle Franco, em 2018.

Ao Exército Brasileiro, o MPF requer que seja informado se foram tomadas providências com vistas a aprimorar o controle e o rastreamento de munições distribuídas aos órgãos de segurança pública.

O lote UZZ18 foi comercializado exclusivamente ao Departamento de Polícia Federal em 2005. A venda se deu de acordo com as condições estabelecidas no Contrato Administrativo 56/06 - COAD/DL06/DPF, tendo sido objeto de devida autorização pelo Exército Brasileiro.

Promoção de arquivamento de Inquérito Policial - O MPF promoveu o arquivamento de inquérito policial (IPL Nº 0023/2018- SR/PF/RJ-15), instaurado em março de 2018, com o objetivo de apurar a autoria pelo eventual desvio ou subtração de munições calibre 9 mm do lote CBC nº UZZ18, do acervo da Polícia Federal.

Em apuração da Polícia Civil do Rio de Janeiro, foi informado que teriam sido encontrados projéteis deflagrados, supostamente pertencentes ao acervo da Polícia Federal, referente ao lote de munições n° UZZ18 de 2006, no local do crime de homicídio da vereadora Marielle Franco.

Duas linhas investigativas foram adotadas no caso, a primeira relativa ao caminho interno seguido do lote de munições UZZ18 (entrada e distribuição interna das munições na Polícia Federal); já a segunda buscou analisar os locais de eventos criminosos onde foram encontrados materiais do mesmo lote de munições, efetuando o caminho “inverso” a fim de identificar como chegaram a posse de quem praticou os delitos.

Em relação a primeira linha, a autoridade policial buscou identificar todos os Inquérito Policiais que apuraram extravio, subtração, furto, roubo de armas e munições do acervo da Polícia Federal, desde 2006 até 2018, bem como a origem e distribuição do lote de munições. Paralelamente, quanto à segunda linha investigativa, munições do lote UZZ18, foram encontrados em eventos criminosos em todo o país.

“Verifica-se que a materialidade delitiva pelo desvio ou subtração de munições calibre 9 mm do lote CBC nº UZZ18, do acervo da Polícia Federal, encontra-se cabalmente demonstrada. Contudo, não foi possível identificar a autoria do crime, sendo infrutíferas as diligências realizadas. Nota-se que a apuração da autoria é de difícil realização, tendo em vista a impossibilidade técnica de rastreio de munições em parcelas menos numerosas do que um lote; a enorme quantidade de munições no calibre 9 mm que compunham o lote UZZ18; o fato de a distribuição do referido lote ter sido realizada em todos os Estados da federação, além do Distrito Federal; o lapso temporal existente entre a aquisição do lote em 2006, a distribuição das munições nas diversas unidades da Polícia Federal em 2007 e os dias atuais”, detalhou o procurador da República Eduardo Benones, na promoção de arquivamento.

Para o Núcleo de Controle Externo da Atividade Policial, “muitas das munições fabricadas pela indústria e de venda restrita ao Poder Público estariam em poder de criminosos por problemas estruturais da Administração Pública, ocorridos posteriormente à entrega definitiva das munições pela CBC”, aponta.

“Do ponto de vista da segurança pública e privada, da efetividade das investigações criminais e da prevenção e inibição do maciço desvio das munições fabricadas no país cada cartucho (culote) deveria, por força de lei, ser marcado de forma eficaz e assim rastreável. Atualmente somente as munições vendidas às forças públicas possuem essa obrigatoriedade. A elucidação do homicídio da vereadora Marielle Franco poderia ter sido mais completa se fosse identificado o local exato de onde saíram as munições. O que se tornou impossível num lote de quase 2 milhões de cartuchos. É preciso investigar e compreender porque e como isto aconteceu. Afinal, cada bala desviada pode implicar na morte de alguém”, alerta o procurador da República Eduardo Benones.