O caminho do Brasil tributário

Wagner Bragança é advogado tributarista e mestre em Direito Constitucional - Foto: Divulgação

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WAGNER BRAGANÇA

As propostas de reforma tributária continuam a transitar pelo Congresso, mas o governo não ficou parado esperando por uma decisão que vai englobar mudanças em todos os principais impostos, taxas e contribuições cobrados por União, Estados e municípios. Editou uma medida provisória - a do Contribuinte Legal - para tentar receber as dívidas daqueles que devem para a União. A MP estimula a regularização dos débitos e regulamenta o que se chama de "transação tributária".

Prevista no Art. 171 do Código Tributário Nacional, a transação tributária é uma alternativa à proposta de concessão de parcelamentos (Refis) que não ajudou a melhorar a arrecadação e só era boa para aqueles que deviam muito, mas também tinham uma alta capacidade de pagar. A medida provisória acaba sendo melhor, porque prevê que só deve receber algum benefício fiscal - como desconto, prazos melhores e parcelamento mais adequado - quem realmente precisar, depois de uma avaliação individual da capacidade de contribuição. O que o governo tenta agora é uma solução negociada com seu devedor, uma forma de garantir o pagamento e o recebimento do débito pela União.

A medida não é tão ampla quanto parece a princípio. Os tais benefícios, como descontos de até 50%, parcelas a longo prazo e carência para o início do pagamento (moratória) atingem apenas o que o contribuinte tem a pagar em juros, multas e encargos. Não inclui o valor do principal da dívida e multas criminais ou decorrentes de fraudes fiscais.

Esses limites têm razão de ser. O governo não quer incentivar a inadimplência e permitir que seu devedor espere por uma solução que alivie o fato de não pagar da forma correta. Se a dívida principal for objeto de renúncia pode ferir o princípio da isonomia e da livre concorrência.

Basta imaginarmos um fato concreto: uma empresa paga seus tributos direitinho e a outra não. Essa última, depois, recebe o benefício de ter a dívida reduzida. Qual seria então a vantagem para quem paga em dia? Não é mesmo correto permitir acordos mais vantajosos para uns e menos para outros.

De qualquer forma, a MP do Contribuinte Legal vai ajudar a reduzir as brigas judiciais e as cobranças fiscais e melhorar o caminho para aqueles que querem empreender. Ela estabelece

que qualquer transação tributária - ou seja, os acordos que vierem a ser feitos - deve atender ao interesse público e observar os princípios da isonomia, da capacidade contributiva, da transparência, da moralidade, da razoável duração dos processos e da eficiência e preservadas as informações protegidas por sigilo, o princípio da publicidade.

O texto destaca os pontos de negociação envolvendo aqueles contribuintes que estão encaixados na dívida ativa e os que são cobrados em alguma instância judicial tributária. E os valores e o número de pessoas, empresas micro, pequenas, médias e grandes envolvidas são muito altos. São 1,9 milhão de devedores na dívida ativa e os débitos superam R$ 1,4 trilhão.

Os processos tributários somam centenas de milhares e envolvem mais de R$ 600 bilhões no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e outros R$ 40 bilhões garantidos por seguro e caução. Só terão direito a negociar aqueles que não praticaram atos fraudulentos ou de concorrência desleal, que reconhecem o débito e não tenham alienado bens sem comunicar ao Fisco. Para esses o parcelamento pode chegar até a 100 meses em alguns casos, o que é bom.

O texto foi assinado no dia 16 e já está valendo, mas precisa ser aprovado por deputados e senadores em até 120 para não perder a validade. Enquanto isso, a Receita Federal vai regulamentar o programa até o fim do ano e definir melhor quem pode aderir ao acordo. O governo conta com essa renegociação para reforçar o caixa nos próximos anos. Calcula que pode arrecadar com ele mais R$ 5,5 bilhões no ano que vem e vai usar os recursos para fechar as contas.

No conjunto, a MP é boa, mais ainda falta muito a ser feito no campo tributário para que o Brasil efetivamente feche as contas no azul. A reforma tributária é mais do que necessária. Assim como o aprimoramento da Lei de Execuções Fiscais que está desatualizada e não é mais capaz de proporcionar uma cobrança efetiva dos débitos da União, Estados e municípios, desperdiçando os recursos públicos - que deixam de arrecadar recursos e ainda são levados a manter milhares de ações em aberto na Justiça para tentar resolver o problema. O Brasil tributário precisa ser modernizado para se equilibrar melhor e ser mais democrático.