Pandemia e Saúde Mental. Até onde aguentaremos?

UFF e FioCruz publicam artigo sobre alterações psiquiátricas causadas pela covid-19 - Foto: Freepik.com

Saúde
Tpografia
  • Mínimo Pequeno Médio Grande Gigante
  • Fonte Padrão Helvetica Segoe Georgia Times

O confinamento é um fator de estresse. Muitas pessoas se queixam de ficar em casa, saírem pouco ou nada. Entretanto, é necessário para evitarmos um problema maior; que seria uma crise na saúde sem assistência adequada. Mas uma crise é sempre um momento de aprendizado. Aprendemos e superamos a crise, ou iremos sucumbir e nada mais teremos que fazer. A humanidade sempre superou as crises, guerras, desastres naturais, várias pandemias, entre outras, e irá superar esta também. Sairemos mais fortes e mais maduros, mais cientes do valor da higiene, dos profissionais de saúde e dos investimentos necessários em educação e pesquisa.

Temos que evitar pensamentos negativos. A internet permite que qualquer pessoa informe sobre um sem embasamento. As afirmações de fontes sem respaldo científico ou com base muito frágil, tornam-se verdades temporárias e criam expectativas fantasiosas. Fontes confiáveis como os sites do Ministério da Saúde, da Academia Nacional de Medicina, da Academia Brasileira de Ciências, entre outros, são seguras. Mas não devemos exagerar na quantidade de informações. Há uma avalanche na mídia de noticias sobre o COVID19 que só aumentam a ansiedade, a hipocondria e abrem a oportunidade para quadros psiquiátricos como a depressão. Temos que conversar, ler e nos informar sobre outros temas também. Por exemplo, trabalhar online, home-office, estudar, fazer atividade física regular, que são excelentes ferramentas para manter a saúde mental.

Sem saúde mental, evidentemente não há saúde. E como psiquiatra posso afirmar que a saúde mental é tudo, principalmente em momentos difíceis, de grande estresse ou crises como estamos todos vivendo agora. Alternativas saudáveis são fundamentais para lidarmos com o problema. A pandemia atual afeta a todos e a nossa saúde mental fica em claro risco de desequilíbrio. Nesta situação mesmo uma pessoa que nunca teve transtorno mental, o estresse pode funcionar como gatilho, principalmente para a ansiedade e a depressão. O estresse, associado a outros fatores, como riscos de doença, problemas econômicos, confinamento, abuso de álcool, solidão, funcionam como estímulos ao sistema nervoso central que pode não reagir adequadamente e desencadear principalmente sintomas de depressão ou de transtornos de ansiedade.

O confinamento em casa por um período longo e ainda indeterminado é outro fator de grande estresse. Um ponto especial deve ser salientado sobre pessoas que vivem sozinhas e que mais sozinhas ficam quando confinadas. A solidão é um fator de risco para depressão e aumenta a taxa de suicídio e abuso de álcool. Neste caso a mídia digital, TV, rádio, leitura podem ajudar. Devemos telefonar ou mandar mensagens positivas, divertidas, sobretudo os que moram sozinhos e para os idosos. Tudo isso ajuda a diminuir o estresse.

Há um convívio familiar maior neste período. Para as famílias que se gostam e curtem a companhia é uma oportunidade para apreciar o momento. Mas também não podemos exagerar. Temos que ter várias atividades em conjunto, como ver filmes, refeições e bate papos com cafezinho, mas não obrigatoriamente ficarmos juntos o tempo todo, todos os dias, sem sair de casa. Ainda mais porque não sabemos quanto tempo ficaremos nesse confinamento. Atenção: o convívio intenso aumenta o risco de desentendimentos, brigas por bobagens e divórcios. Tenha momentos de introspecção, meditação, leitura e relaxamento individual. Isso fará bem a a todos.

Poucas pessoas têm consciência que para uma boa saúde mental é fundamental uma boa saúde física. Fazer atividade física regular, yoga, alongamento, uma leve musculação, e quando possível uma caminhada ou uma corrida nos ajudam a manter um cérebro saudável. Da mesma forma a atividade intelectual, como leitura, filmes, falar de diferentes assuntos, realizar atividades prazerosas, estudar ou trabalhar online nos mantém ativos e evitam ansiedade exagerada e depressão. Muitos de nós têm livros acumulados há um longo tempo, esperando o momento certo para serem lidos. O momento chegou. Aproveitem.

Um outro fato fundamental para a saúde mental é manter uma agenda de sono e vigília. Não podemos trocar o dia pela noite. Ficando em casa muito tempo e com inúmeros os compromissos online é possível que isso ocorra. Então atenção, faça uma agenda de horários para tudo - lazer, trabalho, refeições, ginástica e sono. Tente seguir um padrão saudável. O mundo voltará ao normal e você deve estar bem.

Esta pandemia tem algo único em relação às anteriores. Temos ao nosso alcance a internet e o mundo virtual. Vamos aproveitar, mas não exagerar. Podemos interagir com amigos online, fazer festas e reuniões virtuais. Isto é ótimo para a saúde mental. Podemos ver filmes, ler livros e jornais online. A qualidade do confinamento melhorou para uma boa parcela da população.

É bom lembrar que a alimentação saudável na qualidade e na quantidade, assim como o consumo controlado de álcool são pontos importantes e não devem ser esquecidos. A alimentação regrada evita outras complicações do confinamento como a obesidade. O consumo de álcool com moderação é importante para evitarmos a depressão e de outras complicações do abuso.

Caso o você faça tratamento psiquiátrico, não interrompa. Os atendimentos online ou presenciais continuam funcionando normalmente e não faltará medicação. Qualquer pessoa com um transtorno psiquiátrico pode ter o seu quadro agravado em situação de estresse. Não significa que todos terão, mas a chance é real. Seja o estresse do confinamento, da ameaça de doença, da preocupação com pessoas com maior risco, e da situação de trabalho e econômica que está se agravando. Muitas pessoas estão sem trabalho e com receio de perder o emprego. A preocupação se remédios ou outros bens irão faltar gera um quadro de desespero e preocupações alarmistas. Mantenha o tratamento de forma adequada. Não há nenhum sinal que faltará medicação, assim, não precisa acumular muito remédio. Mantenha a psicoterapia por meio digital online ou mesmo presencial com os cuidados necessários.

Vamos aguentar o confinamento enquanto for necessário, cuidar da nossa saúde física e mental. Principalmente a mental. Segundo as autoridades de saúde, a única forma de atenuarmos o risco de contágio é fazermos um distanciamento social, um confinamento. Uma crise é sempre um momento de aprendizado e estamos todos aprendendo. Por exemplo, notamos claramente que já estão alterados os conceitos de higiene, a valorização do investimento em ciência, educação e saúde, o respeito aos profissionais de saúde dedicados, maior incentivo ao uso das mídias digitais para trabalho, estudo e contatos sociais e a necessidade de uma organização melhor da sociedade. Toda crise traz a oportunidade de melhorarmos e evitarmos novos problemas. A nossa sociedade tem que ser melhor, mais consciente da importância da ciência e da pesquisa.