Há quase uma década foi publicado um livro com as conversas entre o Rabino Abraham Skorka e o Papa Francisco, quando ele ainda assinava Jorge Bergoglio. Os dois amigos conversaram sobre assuntos que diziam respeito a um momento no qual os entendimentos não estavam claros, até por ter sido solapada a própria noção de clareza.
Gostaria de retomar, nesses dois meses, essa conversa única entre o futuro papa e o rabino. A distância que existe entre a Terra e o Céu só não é maior que o abismo que os séculos cavaram entre os homens e suas culturas. Sobretudo, entre aquelas que reconhecem a centralidade da fé na vida humana e aquelas que apostam apenas na possibilidade do homem ser o centro de si mesmo, e só isso.
É essa distância que a conversa dos dois pretende analisar e reduzir.
Para tanto, já no início, o cardeal Bergoglio menciona que no frontispício da Catedral de Buenos Aires se vê a representação do encontro de José com seus irmãos. Décadas de desencontros pediam que as distâncias terminassem em abraços e pranto, numa conversa generosa e honesta, como aconteceu entre eles.
“Meu pai ainda vive?” – pergunta José, em pranto, aos irmãos, os mesmos que o haviam vendido. É a hora em que o abraço recobre a dor, e a pergunta pelo pai vela pelo patrimônio comum, pelas raízes da mesma identidade, e até pelos pântanos malcheirosos alagados quando as pontes caíram.
Precisamos mais de construtores de pontes do que de muralhas. Precisamos conversar!
O rabino e o cardeal conversaram, e de tudo: de Deus à globalização, passando pela morte, aborto, divórcio, dinheiro, pobreza, diálogos e conflitos. É assim, como diz o título, um entendimento sobre o Céu e a Terra.
Não me seria permitido reproduzir o texto original. Remeto os interessados ao livro. O que quero é olhar aquelas questões, com uma década de distância, para comprovar até onde nos movemos e onde ainda continuamos no mesmo lugar. O mundo muda a cada sopro de vento. É preciso mudar junto.
Mas isso só será possível quando a cultura do encontro estiver acima da sedução à dispersão a que os desencontros da História nos conduziram. Se o mundo muda a cada sopro de vento, é preciso sentar e conversar, juntos, para algo mudar.
O verdadeiro diálogo exige que se conheça e entenda o outro; afinal, ele não é tão diferente de nós. “Nós embarcamos rumo a terras distantes, buscamos o conhecimento dos homens, da natureza, de Deus. Só depois notamos que o fantasma perseguido éramos nós mesmos” (Ernesto Sabato).
Quero relembrar, nestes dois meses, o pensamento desses dois homens, tão proximamente distantes. Seria um bom momento para colocar em xeque as nossas distâncias, os nossos saberes e os nossos preconceitos.
É provável que a distância entre a Terra e o Céu seja menor que a de muitos vizinhos de muro. Como seria bom se muros e distâncias fossem derrubados! Até porque, poderemos, um dia, precisar do vizinho. E, naquele dia, nenhum muro deveria atrapalhar.
Sobre o céu e a terra
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