Sem prazo para novos radares

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Os aparelhos que dividem opiniões seguem desligados por toda a cidade. Em alguns locais, como na Avenida Presidente Roosevelt, ainda há sinalização

Foto: Evelen Gouvêa

Há dois anos com os radares desligados em Niterói, duas das principais vias da cidade, a Estrada Caetano Monteiro e a Avenida Roberto Silveira, registraram aumento no número de acidentes, segundo dados do Corpo de Bombeiros. Apesar disso, a Prefeitura de Niterói, que não divulgou uma data para a nova licitação para a compra dos equipamentos, diz que os acidentes de trânsito diminuíram no município. 

Cerca de 50 radares instalados em vias municipais de Niterói estão desligados desde fevereiro de 2017. Na Estrada Caetano Monteiro, em Pendotiba, onde havia um aparelho na altura do número 1700, houve um aumento de 26% no número de ocorrências de trânsito atendidos pelos Bombeiros de 2017, quando foram registrados 80 acidentes, para 2018, quando haviam 101 atendimentos. 

Já na Avenida Roberto Silveira, em Icaraí, 52 acidentes foram atendidos pelo Corpo de Bombeiros em 2016. Quando os radares foram desligados, no ano seguinte, esse número já subiu para 73. Em 2018, mais um aumento: 95 acidentes de trânsito. Isso significa um crescimento de até 83% no índice, após o desligamento dos três aparelhos que haviam na via. 

Em toda a cidade, os dados do Corpo de Bombeiros apontam mais de 3,1 mil ocorrências de trânsito de janeiro a novembro de 2018.

Apesar dessas estatísticas, a Prefeitura de Niterói alega que o número de acidentes registrados na cidade no ano passado diminuiu 1,8%. Já as mortes em acidentes de trânsito também apresentaram queda de 27,7%, segundo a prefeitura. 

De acordo com o Executivo Municipal, que coletou dados da Polícia Militar e da NitTrans, foram 1.103 acidentes em Niterói em 2018, vale lembrar que os números divulgados pela prefeitura levam em conta eventos ocasionados apenas em vias municipais. Enquanto o dos Bombeiros, calcula todo o território da cidade, incluindo as rodovias. O levantamento da prefeitura aponta, ainda, que em 2017 foram 1.124 acidentes. 

A Estrada Francisco da Cruz Nunes, que liga a Região Oceânica a Zona Sul e tem 16 quilômetros de extensão, e, segundo o Executivo, é a via com maior número de acidentes nos últimos seis anos, teve a quantidade de registros reduzida de 436 ocorrências em 2013 para 99 em 2018, redução de 77,2%.

Segundo os dados da Polícia Militar, o bairro com maior número de acidentes é o Centro, com 145 registros, um a mais do que Itaipu, com 144, seguidos do Fonseca, com 129, Icaraí, com 127, e Piratininga com 85. Alameda São Boaventura (65), no Fonseca, Avenida Central (62), na Região Oceânica, Estrada Caetano Monteiro (42), em Pendotiba, e Avenida Visconde do Rio Branco (33), no Centro, completam a lista das vias com mais registros de acidentes em Niterói. 

Até o fechamento da edição, a Prefeitura de Niterói não informou a variação no número de acidentes nas ruas e bairros citados.

De acordo com a PM, o boletim de acidente de trânsito é registrado pelos próprios envolvidos, que não são obrigados a fazê-lo, e pela Polícia Militar quando acionada em acidentes com vítimas. A polícia ressaltou que vários órgãos estão envolvidos nesse tipo de ocorrência, juntos ou separadamente, sendo a PM, NitTrans, Guarda Municipal, Corpo de Bombeiros e ainda a Polícia Civil.

Licitação – O último contrato sobre operação e manutenção de radares em Niterói, com a empresa Sinalização, Gerenciamento e Segurança no Trânsito (Sitran), que atendia o Executivo desde 2008, venceu em 2017. Desde então, todos os aparelhos estão desligados e impossibilitados de multar. Mesmo assim, a sinalização e até mesmo os aparelhos permanecem em algumas ruas, confundindo motoristas. 

“O radar é muito necessário nesta rua, pois nenhum condutor respeita o semáforo e quem para no sinal acredita que será multado caso ultrapasse, já que tem a placa informando. Quase fui atropelada várias vezes, inclusive com meus filhos no colo”, contou a dona de casa Nadine Cruz Ramos, 22 anos, moradora da Rua Desembargador Lima Castro, no Fonseca.

Questionada, a Prefeitura de Niterói não esclareceu quais adequações no edital motivaram o cancelamento da licitação, mas informou que não há nova data para o processo. O Executivo disse que a autarquia está analisando os locais que receberão o equipamento e que a velocidade vai depender da via onde forem instalados. 

Sobre os radares inativos, ressaltou que os equipamentos são de responsabilidade da empresa que prestava o serviço, e serão removidos quando os novos forem instalados. Também não houve resposta quanto ao questionamento sobre a falta de radares ter resultado em aumento no número de multas. 

Especialista defende fiscalização no trânsito

Para especialistas, a fiscalização eletrônica de velocidade é essencial para manter o respeito no trânsito, já que condutores continuam sendo imprudentes. Mestre e doutoranda em Sociologia e Direito pela Universidade Federal Fluminense (UFF), e presidente da Comissão de Acompanhamento e Estudos da Legislação de Trânsito da OAB – Niterói, Paola de Andrade Porto acredita que enquanto a sociedade não chegar em um patamar de consciência para o cumprimento das normas, ainda é preciso utilizar radares e, por consequência, punir os infratores.

Ainda de acordo com a especialista, acidentes no trânsito são a oitava causa de morte no mundo, levando a óbito cerca de 1,3 milhão de pessoas por ano, e o excesso de velocidade está entre suas principais causas. Para ela, assim como qualquer outra cidade que apresente as mesmas características de risco à incolumidade de seus cidadãos em acidentes do trânsito, Niterói possui a necessidade de instalação de radares.

“A base dessa afirmação está no número de acidentes registrados (com vítimas fatais ou não) nos últimos anos. Existem vários estudos que comprovam a eficácia da implantação de radares na diminuição de acidentes no trânsito. A Ecoponte, por exemplo, há pouco tempo divulgou um relatório com a surpreendente redução do números de acidentes depois da instalação dos aparelhos fixos”, citou.

Questionada se a presença do plaqueamento indicativo de radar, mesmo com o aparelho desligado, e se o conhecimento de pontos fiscalizados anteriormente pode influenciar na redução do número de acidentes, Porto afirmou que condutores ainda reduzem a velocidade por costume.

Localização – A Resolução 396/2011 do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), que dispõe sobre requisitos técnicos mínimos para a fiscalização da velocidade de veículos automotores, reboques e semirreboques, conforme o Código de Trânsito Brasileiro, estabelece que a localização do equipamento fixo deve ser definida de acordo com um estudo técnico, que é elaborado por peritos a partir da análise de dados oficiais como incidência de acidentes, dias da semana, horários e tipo de acidentes de cada local.

Motoristas pedem critério por conta da violência

Apesar de ser um meio de fiscalização requisitado por conta do risco de acidentes em altas velocidades, motoristas pedem bom senso numa futura instalação de radar. O medo é que os aparelhos possam ser instalados em áreas consideradas de risco, em que pode ser perigoso reduzir a velocidade ou até mesmo parar, em casos de semáforo com radar.

Um motorista que prefere não se identificar, aponta um dos equipamentos que eram mal posicionados na cidade, na Estrada Francisco da Cruz Nunes, próximo à Comunidade do Cantagalo, no Largo da Batalha. Ele relembra que, durante a noite, preferia ultrapassar o radar pela contramão – quando a via não possuía trânsito –, impedindo que a infração fosse computada, do que aguardar o semáforo abrir.

“Ali não dá para parar de madrugada e ficar aguardando que algo aconteça”, disse.

Para o motorista Alexandre Carvalho, de 40 anos, além da cidade já ter muito trânsito, reduzir a velocidade para a fiscalização, pode aumentar risco em algumas ruas por conta da violência.

Paradoxo – A especialista Paola de Andrade Porto, presidente da Comissão de Acompanhamento e Estudos da Legislação de Trânsito da OAB - Niterói, ressalta que a questão da violência urbana e da segurança no trânsito podem ser um paradoxo mas devem ser tratadas e solucionadas de maneiras distintas.

“De um lado há a segurança viária e de outro a segurança pública. Ambas as questões exigem uma ação eficiente para melhorar a mobilidade urbana. É necessário que cada órgão do poder público, dentro de suas atribuições legais, identifique os locais de maiores acidentes e de maior índice de violência, para a partir daí, fazer um trabalho direcionado. O que não se pode admitir é que o cidadão desrespeite a lei por conta da omissão do próprio Estado na prestação de serviço de segurança pública”, defendeu  Paola Andrade Porto.

Proibição – Está em vigor desde 2017 a Lei 7.580/17,  do deputado Dionísio Lins (PP), que proíbe a instalação de novos radares de velocidade próximos a áreas consideradas de risco. O texto considera locais “cujas comunidades são mapeadas e conhecidas por serem de alto índice de violência e confronto armado em vias urbanas”.