Aconteceu em 1967

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Álbum "Are You Experienced", do cantor Jimi Hendrix

Foto: Divulgação

O ano de 1967 foi fundamental para o mercado fonográfico e para todo o cenário musical do universo pop rock. Por mais que muitos considerem que o grande marco inicial de tudo o que aconteceu naquele ano tenha sido o lançamento, em maio, do badalado “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band”, dos Beatles, outros eventos também foram importantes para transformar 1967 em um ano fundamental e um divisor de águas para a cultura pop, exercendo profunda influência nos trabalhos de artistas que surgiram a partir de então. 

Segundo Andrea Vizzotto, doutora em história social pela UFRJ e pesquisadora em mercado fonográfico, hoje é possível afirmar que “Sgt. Pepper’s” não surgiu por acaso. Já havia, em 1966, algumas experiências que apontavam para o psicodelismo que iria explodir no ano seguinte. Vários artistas, hoje consagrados, lançaram seus primeiros álbuns em 1967, ou fizeram suas primeiras aparições para o grande público, como no caso de Janis Joplin, que se apresentou, em junho, no Monterey International Pop Music Festival, e lançou seu primeiro álbum ‘Big Brother & The Holding Company’ em agosto desse mesmo ano. Outro exemplo é Jimi Hendrix, que também apareceu para o público dos Estados Unidos nesse mesmo festival e já havia lançado ‘Are you experienced’, seu primeiro álbum, em maio, no Reino Unido.

“O disco ‘Freak Out’, de Frank Zappa e sua banda The Mothers of Inventions, é o primeiro álbum duplo da história do rock, uma inovação para a época. Suas canções eram pouco convencionais para o padrão apresentado até então. Outro marco importante é a música ‘Goin’ Home’, do álbum ‘After the Math’, do conjunto britânico Rolling Stones, que possui mais de 11 minutos de duração, algo impensável até então. E a mais importante das referências pré-psicodélicas foi o lançamento do álbum ‘Pet Sounds’, do conjunto norte-americano Beach Boys. O ambicioso projeto pessoal de Brian Wilson – que tinha a clara intenção de querer criar algo que fosse melhor do que os Beatles – era completamente inovador até na trajetória da própria banda. Se Brian Wilson conseguiu ou não fazer algo melhor do que os Beatles é irrelevante. O fato é que ‘Pet Sounds’ exerceu realmente uma profunda influência não só no trabalho do famoso quarteto de Liverpool como em todas as outras grandes bandas da época, que realmente passaram a produzir discos conceitualmente mais elaborados, com arranjos mais sofisticados”, explica Andrea. 

As bandas americanas The Doors e Velvet Underground também estrearam este ano. A primeira lançou aquele que é considerado pelos críticos a melhor estreia da história do rock. Lançado em agosto de 1967, o disco “The Doors” possui canções que se tornaram clássicos de uma geração, como “Light my fire e The End”, que tornou-se o tema de abertura do filme “Apocalipse Now’’, de Francis Ford Coppola, em 1979. A banda também tornou-se mundialmente conhecida devido ao caráter transgressivo das performances do seu vocalista Jim Morrison, que serviu de influência para diversos artistas, como Iggy Pop. 

Já o Velvet Underground se consagrou no cenário alternativo Nova Iorquino que estava emergindo nesse período. A banda foi “adotada” pelo famoso artista Andy Warhol, que produziu o homônimo álbum de estreia da então The Velvet Underground & Nico.  A capa do álbum traz a icônica ilustração da capa do famoso “disco da banana”. A banda ainda tinha como integrantes dois nomes que viriam a se consagrar no cenário pop-rock: o vocalista Lou Reed e o multi-instrumentista e produtor musical John Cale. 

Álbum "Sgt. Peppers", dos Beatles

Foto: Divulgação

“As letras das canções do Velvet também se tornaram famosas por serem marcadas pelo teor nada conservador. ‘Experimente o chicote’, esbravejava Lou Reed na música ‘Venus in furs’. Outro fato que não podemos esquecer é que é atribuído à banda Velvet Underground as primeiras experiências com a música minimalista no cenário pop-rock, ou seja, canções com repetições de um mesmo tema, como podemos ouvir nos mais de 7 minutos da canção Heroin”, afirma Andrea.

Os britânicos Pink Floyd e David Bowie também são grandes referências do ano de 1967. Apesar de estrearem este ano, eles viriam a se consagrar apenas posteriormente, na dácada de 1970.  “The Piper at the Gates of Dawn”, álbum de estreia de Pink Floyd, foi lançado em agosto de 1967 e  marcou o início da sua trajetória ainda como uma banda psicodélica, liderada pelo  vocalista Syd Barrett. Nessa formação original, a banda ainda não contava com aquele que viria a ser um dos seus integrantes mais importantes: o guitarrista David Gilmour. Com a chegada dele, o Pink Floyd deu uma guinada para o nascente rock progressivo. O sucesso foi tanto, que a sua gravadora EMI-Odeon concentra na banda o poder da indústria fonográfica após o fim da sua banda mais rentável: os Beatles. O cantor David Bowie lançou seu primeiro disco homônimo, em junho de 1967. Assim como Pink Floyd, seu primeiro disco não chamou muito a atenção do público, porém, a partir dos anos 1970, o artista britânico atingiu o estrelato e lá se manteve até sua morte, em janeiro no ano passado. 

No Brasil, o ano de 1967 é marcado pela estreia de artistas que se tornariam nomes consagrados da nossa música popular brasileira, como Gilberto Gil, que, em maio lançou seu primeiro álbum: ‘Louvação’. Ainda pré-tropicalista, várias das canções são marcadas pela temática do engajamento político que influenciava os artistas da então nascente MPB. No primeiro semestre deste ano, Caetano Veloso e Gal Costa dividiram a estreia com o lançamento do disco “Domingo”. Também pré-tropicalista, a sonoridade ainda se inspirava fortemente na bossa nova, movimento que influenciava muitas das correntes musicais que se autodenominavam “modernas” em meados da década de 1960. E essa sonoridade estava presente também na estreia de Gil.

Em um contexto de Ditadura Militar Brasileira, que começou em 1964, aconteceu, em 1967,  o Festival de Música Popular Brasileira promovido pela TV Record. Esse é o pontapé inicial   do Tropicalismo,  movimento de um grupo de compositores baianos liderados por Caetano Veloso que resultou numa síntese assistemática de alguns elementos da brasilidade, em sintonia com as manifestações estéticas e culturais nos anos de 67 e 68.  Neste festival, canções como “Domingo no Parque”, com Gilberto Gil e a – ainda desconhecida do público - banda Mutantes e “Alegria, Alegria”, com Caetano Veloso e a banda de rock argentino Beat Boys. 

No fim de 1967, Caetano Veloso lançou também um disco homônimo, com a canção Tropicália, inspirada na obra-ambiência Tropicália, de Helio Oiticica, que explora uma temática da brasilidade aberta a referenciais estrangeiros e em que convivem imagens arcaicas e modernas. Outro nome que estreou um disco neste ano foi Milton Nascimento, com Travessia. Porém, o artista só iria se consagrar a partir de 1970, influenciando todo o processo de renovação da MPB pós-1972. 

“Apesar disso, a canção-título do disco, ou seja, Travessia, manteve-se como a sua canção mais conhecida ao longo de toda a sua carreira, sendo regravada por diversos artistas, como a islandesa Björk. E também surgia um grande nome do rock brasileiro em 1967, Raul Seixas com a sua efêmera banda Raulzito e os Panteras, que lançou o álbum homônimo em janeiro de 1968, embora o selo impresso no vinil indique o ano de 1967, indicando provavelmente o ano de gravação. A banda The Beatles influenciava toda a Jovem Guarda brasileira, e a referência ao quarteto está presente não só nas músicas como também já na capa do álbum. Não se tornou um disco de sucesso de público ou de crítica, mas trazia aquele que seria um dos mais importantes roqueiros brasileiros”, finaliza Andrea.