Gritos de ser humano

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O espetáculo une música, teatro, literatura, artes plásticas, performance e arrisca na liberdade criativa para apresentar temas humanos e de muita identificação

Foto: Sérgio Odilon / Divulgação

“Mendigos, o grito da fome; o legítimo e o ilegítimo, o grito de alerta; as máscaras, o grito de dor; os bonecos decepados, o grito de horror; o aborto, o grito da perda; a criada, o grito da subserviência; o banheiro, o grito de escárnio; a família, o grito da gula; a gula, o grito da morte; o homem encarcerado, o grito de liberdade; o hospício, o grito de paz”. Diante de inúmeras expressões atuais do desespero humano, o espetáculo “O Grito” surgiu de pesquisas laboratoriais desenvolvidas pela Companhia Ópera Prima Teatral na busca por um teatro irreverente e, ao mesmo tempo, despretensioso, com o objetivo de dialogar com todas as linguagens artísticas. 

Com direção de Carrique Vieira, a obra entra em cartaz neste sábado, no Casarão da Fróes, em São Francisco, após uma curta temporada no Terreiro Contemporâneo, na Lapa. O espetáculo será encenado aos sábados e domingos de novembro e utilizará os três pavimentos da casa e, também, a piscina. 

O texto conduzirá o público por todos os ambientes do casarão, junto aos personagens. Todos serão norteados e acompanhados pelo palhaço interpretado pelo ator Silvio Garcia. Unindo música, teatro, literatura, artes plásticas, performance e arriscando na liberdade criativa, o espetáculo apresenta o objetivo de unificar a arte em torno da temática do ser humano. 

A peça conta com direção de Carrique Vieira, que também está no elenco

Foto: Sérgio Odilon / Divulgação

“Como no expressionismo, adotamos uma atitude e uma nova forma de entender o teatro, que une diversas tendências, formações e níveis intelectuais”, define o diretor Carrique Vieira.

A companhia assina, também, o cenário e os figurinos que, ao longo da peça, fazem com que cada ator troque, em média, três vezes as vestes. Segundo Carrique, o cenário é simples e funcional, mas cumpre de forma profícua a função de servir de suporte para o elenco alcançar o máximo de sua atuação alegórica e surreal. Na ambientação, painéis ilustram os golpes de Estado que ocorreram na América Latina e máscaras representam as vítimas de tortura. As artes plásticas integram o cenário com a exposição “Freak Art”, de Chris Moraes, baseada no que a artista define como “sombrio lúdico”, que se inspirou nas artes macabras de Tim Burton e Tarantino. Compondo o cenário, a escultura de uma cabeça de 86cm por 70cm diâmetro foi criada pela artista Priscila Cardoso. Batizada como “A gula”, a escultura apresenta um dos temas abordado pelo texto. 

Os conceitos incorporados no que se conhece como os sete pecados capitais, trata-se de uma classificação de condições humanas, hoje conhecidas como vícios, que precede ao surgimento do cristianismo. Sendo, mais tarde, usada pelo catolicismo com intuito de controlar, educar e proteger seus seguidores, conseguindo, então, controlar os instintos básicos do ser humano. 

A característica da gula é engolir sem digerir e, na peça, é usada como crítica ao consumo de informações e conhecimento intelectual nos tempos atuais. O pecado capital caracterizado pelo excesso, numa simbologia maior, significa, também, voracidade. Além disso, a gula pode ser entendida como intelectual. 

“A sensação é de que não estamos fazendo tudo que o nosso potencial permite. Que estamos vivendo sem atender às nossas expectativas. A atitude mental básica é: necessito aprender e possuir tudo. E, assim, enlouquecer”, explica Carrique.

Ao compor a obra, o autor pretendia unir sua estética literária a textos de Caio Fernando Abreu, se aproveitando de uma sequência de cenas que se conectam, dando ao espectador o controle inconsciente da modulação das sensações e, também, dos sentimentos. 

“A mente humana, neste caso, passa a ser o objeto catalizador da essência do artista. É tudo real! É mesmo um grito. As pessoas não costumam gostar de ver sangue, nem de falar sobre temas como aborto, racismo, loucura. Mas ‘O Grito’, na verdade, prioriza a expressão de sentimentos em relação à simples descrição dos fatos. Isso promove uma alteração da realidade para expressar, de forma subjetiva, o ser humano e a sua natureza”, conclui o diretor.

Além de propor inúmeras indagações, a obra pretende mostrar a diversidade cultural e, também, a capacidade do País de ser multiartístico. Também composta pelo autor para o espetáculo, a música “Minha Voz” será interpretada pela atriz e cantora Julia Sorrentino, que vai contracenar com o arranjador da canção, o músico Cris Saramago. 

O Casarão da Fróes fica na Estrada Leopoldo Fróes, 435, São Francisco, em Niterói. Sábados e domingos, até o dia 27, às 20h. Preço: R$ 50 (inteira). Censura: 18 anos. Telefone: 97953-1041.