Por que a arte é considerada artigo da elite?

*Giselli Ribeiro Produtora Cultural, Especialista em Linguagens Artísticas, Cultura e Educação pelo IFRJ e formada em Artes Visuais pela UERJ - Foto: Divulgação

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Giselli Ribeiro*

Remonta ao século XVIII, em países como a França, a consolidação de ideais de democratização do acesso à cultura. A Revolução Francesa ocorrida em 1789 trouxe como lema a "Liberdade, Igualdade e Fraternidade". Em um continente marcado pelos privilégios associados aos nobres e monarcas, clérigos e uma aristocracia rural, esses ideais sustentados por uma população em busca de direitos, provocaram mudanças profundas na estrutura social.

Uma das principais marcas de distinção social naquela época era a quantidade de obras de arte que as famílias/senhores feudais possuíam em seu território. Com isso, diversos artistas e familiares, desde a Idade Média, eram contratados para morar nos castelos e passar até mais de 30 anos retratando todos os membros da família proprietária dessas terras.

Nesse sentido, as obras de artes eram produzidas em determinados espaços e usufruídas apenas por quem tinha acesso a esses espaços. Essa prática não se limitava à aristocracia. Os religiosos também tinham práticas parecidas, contratando pintores e escultores para produzirem as obras dentro dos seus recintos. Portanto, essa prática de busca de distinção social era utilizada por aristocratas, religiosos, comerciantes e banqueiros que apoiam as artes em busca de reconhecimento. Esses são os denominados "mecenas" que posteriormente daria origem a um dos mecanismo de incentivo fiscal à cultura no Brasil: o mecenato.

Retornando à França, no final do século XVII, o rei Luís XIV resolveu deixar o Palácio do Louvre para ir morar no Palácio de Versailles. Com isso, o Louvre passa a ter a função de abrigar as obras de arte da monarquia, além de abrigar as Academias de Arte. Porém, apenas os nobres podiam usufruir do espaço.

Com a proclamação da república francesa, em 1792, um sentimento de busca de destruição das marcas de um passado feudal e aristocrático tomou conta de todo o país. E, com isso, iniciou-se um processo de saque, incêndio e destruição de castelos e igrejas. Preocupado com o que seria o "apagamento cultural" produzido no passado, o Governo Provisório decreta a estatização de todas as obras de artes existentes e as confisca: dos castelos e das igrejas.

O objetivo principal era a manutenção dos resquícios da monarquia como lugar de memória. Dando continuidade à política de preservação do que viria a ser reconhecido como o início de uma política de patrimônio cultural, em 1793, o Palácio do Louvre é transformado no Museu do Louvre.

Portanto, o que podemos considerar como início de uma política de democratização ao acesso à arte e à cultura estaria trazendo no seu interior conceitos importantes que iriam marcar as políticas culturais no decorrer de séculos: quem distingue o que é ou não obra de arte e; quem define como se deve dar o acesso ao que é considerado arte.

No Brasil o processo foi parecido, mas com marcas de diferenciação importantes. Se, como visto anteriormente, a monarquia portuguesa foi a mais importante mecenas a partir de 1808, a Proclamação da República não trouxe consigo uma política de preservação do patrimônio ou de democratização ao acesso à cultura. Apenas após a chamada Revolução (ou Golpe) de 30 que há um início de um debate sobre a forma de ampliar o repertório cultural da população brasileira que já vinha se dando em grupos insatisfeitos com o processo incompleto da criação da República.

Com o final da 1ª Guerra Mundial e as transformações pelas quais vão passar as artes, desde as visuais até à literatura, um grupo de intelectuais, escritores e artistas passam a discutir mais ativamente o modelo de cultura existente e surge um movimento que vai ser posteriormente denominado de modernista: a Semana de Arte Moderna, organizada em São Paulo, em 1922.

Na próxima semana, vou detalhar a chegada de Vargas ao poder e sua parceria com diversos modernistas. Juntos, decidem pela "elevação cultural do povo" e ignoram o grau de elitismo que havia na educação e no acesso à cultura.

Com detalhes, contarei sobre a tentativa do fim da malandragem e como acontece a movimentação para preservação do patrimônio imaterial da produção artística genuinamente brasileira, que, por sua natureza, trazia contradições para as políticas públicas da época.

Até o próximo domingo!