Por Redação
Já se foi o tempo em que os idosos ficavam em casa só cuidando dos netos. Os novos vovôs e vovós praticam esporte, dançam, são ativos na internet e voltam para as salas de aula.
E voltam em grande estilo: de meias ¾, saia plissada e sorriso no rosto. É assim, impecável, que Ignácia de Carvalho do Carmo, de 85 anos, chega no Colégio Estadual Clodomiro Vasconcelos, em Itaguaí, todos os dias. Ela é aluna do primeiro ano do curso Normal e sonha em se tornar professora. E o que a Dona Naná (como é carinhosamente chamada pelas colegas de turma) tem muito para ensinar, é sobre lição de vida.
Aos 8 anos, no bairro de Piracema, Dona Naná ganhou de presente do pai uma enxada e foi trabalhar no campo. Ela gostava de mexer com a terra, mas sonhava mesmo era estar em uma sala de aula, o que só aconteceu em 1948, aos 11 anos de idade. A alegria da menina em estudar durou pouco. Dona Naná ficou apenas um ano na escola.
"Meu pai não incentivava os filhos a estudarem, queria que a gente trabalhasse. Mas era meu sonho estudar e desde pequena já dizia que queria ser professora. Não pensava em outra coisa", explica Dona Naná.
A idosa conta que o pouco tempo em que ficou na escola sempre faltava às aulas às quintas-feiras, porque era o dia da conferência do uniforme.
"Eu não tinha o uniforme completo, não tinha sapatos, e não queria fazer feio né? Minha família não tinha condições, então o jeito era faltar a aula às quintas. Eu usava um sapato com solado de cordas. Como iria me apresentar sem os sapatos?, ressalta a normalista.
Hoje o seu uniforme é impecável. Dona Naná prepara tudo no dia anterior para chegar bem bonita na escola.
"Foi uma alegria tão grande o dia em que comprei este uniforme. Posso dizer que foi a maior alegria da minha vida o dia que vesti esse uniforme, minha consagração. Comprei logo dois para que eles fiquem sempre limpinhos. Não gosto de ver as meninas que não cuidam de seus uniformes. O meu está sempre lindo", fala, com orgulho.
Seu retorno às salas de aula aconteceu em 2019, aos 82 anos. Uma sobrinha da idosa sabendo dos sonhos da tia a matriculou em um curso de Educação de Jovens e Adultos (EJA). O programa do Governo do Estado, elaborado pela Secretaria de Estado de Educação (Seeduc), é um incentivo para quem parou os estudos, mas nunca desistiu do “canudo”, como a Dona Naná. Mas o sonho de virar aluna ainda era pouco; ela queria ser professora. Por isso este ano, mais uma vez com a ajuda da sobrinha, a idosa se matriculou no Curso de Formação de Professores do Colégio Estadual Clodomiro Vasconcelos. Na sala de aula, ela é o xodó das normalistas.
"Quando vim para a escola eu já sabia que a Dona Naná estaria entre as alunas da turma. Ela chegou aqui no segundo dia de aula, com um sorrisão no rosto, feliz de estar realizando seu sonho. E eu fiquei mais feliz ainda de ver ela, com a idade que tem, fazendo o que tanto desejou a vida toda", conta a amiga de classe Ana Clara Venturin, 16 anos.
Maria Eduarda Espinheira, 15 anos, outra colega de turma, fala de Dona Naná com muito carinho.
"Quando cheguei aqui fiquei maravilhada. Ela é muito linda. Ela arruma o cabelinho todo para trás. Até nos dias frios ela vem toda arrumadinha, mesmo quando não dá para usar saia ela coloca calça do uniforme, sapatilha e vem impecável", diz a amiga.
A diretora do Colégio Estadual Clodomiro Vasconcelos, Wania do Santos Dumont, conta que foi uma grande surpresa receber a Dona Naná na instituição e que está muito feliz de fazer parte do sonho da aluna mais idosa de toda a rede estadual.
"A gente abraçou a Dona Naná e a experiência está sendo magnífica. No início ficamos preocupadas dela não ser muito bem recebida pelas outras alunas. Mas não houve conflito de idade, ela aqui é respeitada demais e muito querida. Já sonhamos com a formatura da turma. Imagina, vai ser um espetáculo!, diz, emocionada.
Hoje em toda a rede estadual de ensino há 579 idosos (acima dos 60 anos) matriculados.
E quando falamos de sonhos, Dona Naná dá o recado rapidamente.
"Nunca desista dos seus sonhos, seja o que for, não importa a idade. E tudo é permitido, é só você querer! Olha só eu aqui!
A história da Dona Naná é só mais uma que deve ser festejada no Dia Internacional do Idoso. A data foi instituída em 1991 pela Organização das Nações Unidas (ONU).