Mascarando um imposto

Marcus Vinícius Dias, diretor do Azevedo Lima - Foto: Divulgação

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Por Marcus Vinicius Dias

Em meio à nossa já aniversariante pandemia, surge em debate no Parlamento uma proposta de, enfim, se realizar a tão falada reforma do sistema tributário. De modo sintético, discute-se o quanto, pelo o quê, e quem irá pagar imposto no país. O assunto ganhou calor ao se levantar a hipótese de se tributar os dividendos. E pagar mais imposto, desde os tempos da Inconfidência, não é algo que agrade ao brasileiro, nossa carga tributária há décadas em aumento progressivo.

Debate também presente, desde o início, nas rodas de conversa, nas bancadas dos telejornais e, recentemente, no próprio Ministério da Saúde, é sobre a necessidade ou não das máscaras no enfrentamento à Covid 19. No geral, seu papel como instrumento de resistência à disseminação do vírus é tido como consenso pela maioria. Há maior divergência sobre que tipo de máscara deve ser utilizada, em que ambientes ela deve ser obrigatória e até quando ela será necessária. Não me parece haver, no entanto, grande discordância sobre o uso das máscaras como medida de saúde. Do mesmo modo, parece que é consenso, entre a maioria dos tributaristas e parlamentares, que os gastos com saúde seguirão na lista das despesas que o cidadão tem o direito de deduzir do seu imposto devido ao Leão.

A dedução no imposto de renda é um valor que pode ser abatido da base de cálculo na hora de se fazer a declaração anual. A depender do tipo de dedução, e de sua extensão, o efeito produzido pode gerar uma diminuição no valor do pagamento do imposto devido ou, até mesmo, a tão desejada restituição, ou seja, a devolução de parte do que foi retido pela Viúva do nosso suado dinheiro.

Ao andar pelas ruas observamos mundo afora a presença desta nova indumentária que nos tapa a boca e o nariz. Há de todos os tipos e para todos os gostos. Há quem prefira as de pano, as estampadas, as cirúrgicas, as de bico de pato. Há quem prefira duas; há quem fique melhor e mais bonito com elas, é fato; mas, no geral, usamos este dispositivo facial por determinação de Lei. E tão logo não seja mais obrigatório, creio, a maioria irá transformá-las em artigos de lixo ou de museu.

Saúde é direito do cidadão e dever do Estado, quis o Constituinte. Nossas máscaras, obrigatórias, em geral não nos foram dadas, mas compradas. Há hoje, ainda, enorme apelo das autoridades sanitárias e dos especialistas em saúde para que sigamos usando, entre outras medidas ditas protetivas, a máscara facial, a fim de se diminuir o risco de contágio pelo vírus que há mais de ano nos consome parte significativa da pauta diária. E tanto no atual regime tributário, quanto no proposto em debate na Câmara, há expresso a possibilidade de abatimento integral dos gastos dos pagadores de impostos com despesas de saúde.

Nos Estados Unidos, visando a incentivar as pessoas a se vacinarem contra a Covid, os governos têm oferecido recompensas e premiações que podem chegar a 100 dólares para quem se vacinar. Nada mais persuasivo para se implementar uma medida que gera resistência do que um agrado no bolso. Essas medidas aos nossos olhos, que estão ávidos pela chegada da oportunidade de, enfim, termos todos tomado a nossa agulhada e superado essa tragédia mundial, pode parecer algo surreal. Mas tem em si a sua lógica.

Neste mesmo espírito, se de fato a saúde é um dever do Estado; se de fato o uso obrigatório de máscara é uma medida de saúde individual e coletiva; se de fato queremos incentivar o uso deste dispositivo por todos, devemos aproveitar o embalo da discussão da reforma tributária e debater, ao menos em tese, e ao menos em algum limite por família, um abatimento no imposto de renda pelos gastos que todos nós, pessoas físicas, passamos a ter por uma questão de saúde pública. E se é verdade que ao brasileiro, sendo gratuito, até injeção é bem-vinda, talvez a possibilidade de algum reembolso pelo Estado dos gastos com a aquisição de máscara assegure uma adesão sem precedentes a esta medida sanitária.

*Marcus Vinícius Dias é médico do Ministério da Saúde, mestre em economia pelo IBMEC e atual diretor do Hospital Azevedo Lima