Reforma legislativa nas medidas socioeducativas

Seus Direitos na Justiça com Guaraci Campos Vianna
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Dr. Guaraci de Campos Vianna

As diferenças básicas entre o sistema penal e o socioeducativo são a competência jurisdicional e a finalidade da medida aplicada. A aplicação da medida socioeducativa considerará critérios um pouco mais elásticos do que o sistema penal, fundamentos basicamente nos artigos 100 e 112, §1º do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Cumpre ainda observar que, em sincronia com o sistema penal (LEP- Lei de Execuções Penais), existe para a competência infracional, lei que regulamenta o cumprimento das medidas socioeducativas (Lei 12594/2012) buscando coordenar os sistemas Estaduais, Distrital e Municipais, bem como todos os planos, políticas e programas específicos de atendimento a adolescente em conflito com a lei.

Ambas, penas e medidas socioeducativas, tem a finalidade retributiva, mas estas últimas vão além. A medida socioeducativa tem por finalidade preponderante a prevenção e reeducação.

A aplicação das medidas socioeducativas na forma prevista, sem dúvida é um eficaz instrumento de responsabilização dos adolescentes em conflito com a lei e todos que o cercam. Entretanto há uma necessidade de aprimoramento da lei 8069/90, por exemplo, aumentando-se os prazos de execução das medidas e limitando ou regrando o arbítrio judicial na imposição das mesmas, mas sem que se altere o patamar de dezoito anos como referencial para a imputabilidade penal, por que isso agravaria a questão, aumentando a violência e diminuindo as chances de ressocialização.

Mas vejam, recentemente o pacote anticrime do Ministro Sergio Moro aumentou o limite de pena de reclusão de 30 para 40 anos para os criminosos adultos... Acreditamos que os limites das medidas socioeducativas deveriam ser aumentados na mesma proporção ou até mais. O ideal é que o jovem cumpra medida até os 25 anos e o prazo máximo de internação seja aumentado de 3 para 5 anos, por ato infracional praticado, respeitando-se o limite de 25 anos de idade (e não 21 anos de idade, como é hoje).

Os problemas que enfrentamos são, sem dúvida, a crença social e até jurídica, para nós falsa, de que o sistema é inútil, não recupera e ainda degrada e estigmatiza. Estamos convencidos que não pode o sistema ser avaliado e nem tampouco julgado, porque ao longo da história brasileira ele, a não ser formalmente, nunca existiu e nunca foi aplicado ou usado em todos os seus fundamentos e práticas. Não há tempo hábil de permanência nas instituições para se recuperar. As internações são cumpridas em pouco tempo, no regime de semiliberdade as fugas são constantes e, no regime aberto (liberdade assistida) não há estrutura suficiente nos Municípios.

A crença de utilidade (ou a contrária) só poderá existir, cientificamente, quando houver aplicação integral do sistema progressivo, partindo do regime fechado, passando pelos regimes semiaberto e aberto e chegando como ponto derradeiro, anterior à recuperação do criminoso, maior ou menor de idade, às penas ou medidas alternativas à privação de liberdade.

Não podemos ficar inertes diante da violência que nos rouba a humanidade, que nos animaliza. Há que se exigir ações efetivas por parte do Estado e da sociedade, é imperioso, portanto, uma reação contrária ao cotidiano avanço da violência, do descaso com os direitos humanos mais elementares.

É preciso aplicar medidas socioeducativas em prazo suficiente para equilibrar a resposta social ao crime com as possibilidades e perspectivas de ressocialização. Daí a reforma legislativa proposta. No sistema atual, não há satisfação de objetivo algum. Não há punição nem recuperação. É preciso adequar a execução das medidas destinadas aos adolescentes a sua dupla finalidade (punir e ressocializar/recuperar) e, para tanto, urge que se adotem medidas práticas e funcionais.

Minimamente, além das medidas de contenção e segurança (art. 125 da Lei 8069/90), é preciso garantir a escolarização sequencial para o jovem desde o momento em que iniciar o cumprimento da medida (v.g. internação) até a sua efetiva liberação. E essa liberação deveria ocorrer somente no regime de liberdade assistida, com passagem obrigatória pela semiliberdade, após um tempo mínimo de dois anos pelo menos, nos casos de atos infracionais graves. Mas não é o que ocorre, há jovens que não passam nem seis meses no regime fechado e de lá vão direto para a liberdade assistida e sem escolarização, que aliás, por lei é obrigatória (art. 124 da Lei 8069/90). Não se registram atividades pedagógicas e religiosas nas unidades, para falar o mínimo. Os agentes do sistema fazem verdadeiros milagres. Mas a assistência do poder público é precária. Como recuperar assim? Nem mesmo para punir o sistema está servindo; do jeito que está não se pune, nem se recupera o que significa dizer que os sujeitos em conflito com a lei voltam a delinquir. Daí se propor o tema para debate, começando pela mudança legislativa.