Fraude à execução e a boa-fé do terceiro

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GUARACI CAMPOS VIANNA

A fraude à execução é manobra do devedor que aliena (vende) seu patrimônio (bens), para não pagar suas dívidas provenientes de uma ação judicial já proposta. Ou seja: na pendência de ações judiciais cobrando suas dívidas, sem bens para garantir o pagamento delas, o devedor resolve vender seu patrimônio no todo ou em parte.

O instituto é regulado pelo Código de Processo Civil (art. 792) e pelos artigos 54 e 55 da Lei 13.097/15, e sucintamente, espera-se aqui estabelecer um parâmetro para definir se é possível e válida ou não a venda de bens na pendência de ação judicial proposta sob a ótica do comprador.

Sendo a fraude contra credores uma conduta ilícita praticada pelo devedor, mau pagador, contra o credor que passa a ser vítima, pois além de não receber o devido, corre o risco de procurar o judiciário e obter uma "vitória de pirro", ou seja, ganha, mas não leva, pois o devedor não tem bens (patrimônio) para garantir o pagamento da dívida, uma vez que fora vendido anteriormente o que possuía. A questão é: quando o comprador (terceiro que não é credor ou devedor e não participa dessa relação jurídica) está de boa fé?(Porque não se sabe da existência da dívida).

A despeito de muita controvérsia doutrinária e jurisprudencial por conta de se prescindir da análise do elemento subjetivo (dolo/culpa), o Superior Tribunal de Justiça pacificou questão ao editar o enunciado 375 de sua súmula de jurisprudência dominante com o seguinte teor: "O reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente.".

O enunciado 375 da súmula do STJ deixa claro que a má-fé do adquirente não é presumida. Sem a prova pré-constituída da má-fé não se pode cogitar a fraude. Todo o sistema jurídico, legal, doutrinário e jurisprudencial, optou por proteger o adquirente de boa fé.

O artigo 792 do CPC: "A alienação ou a oneração de bem é considerada fraude à execução: I - quando sobre o bem pender ação fundada em direito real ou com pretensão reipersecutória, desde que a pendência do processo tenha sido averbada no respectivo registro público, se houver; II - quando tiver sido averbada, no registro do bem, a pendência do processo de execução, na forma do art. 828; III - quando tiver sido averbado, no registro do bem, hipoteca judiciária ou outro ato de constrição judicial originário do processo onde foi arguida a fraude; IV - quando, ao tempo da alienação ou da oneração, tramitava contra o devedor ação capaz de reduzi-lo à insolvência; V - nos demais casos expressos em lei. § 1º A alienação em fraude à execução é ineficaz em relação ao exequente. § 2º No caso de aquisição de bem não sujeito a registro, o terceiro adquirente tem o ônus de provar que adotou as cautelas necessárias para a aquisição, mediante a exibição das certidões pertinentes, obtidas no domicílio do vendedor e no local onde se encontra o bem. § 3º Nos casos de desconsideração da personalidade jurídica, a fraude à execução verifica-se a partir da citação da parte cuja personalidade se pretende desconsiderar. § 4º Antes de declarar a fraude à execução, o juiz deverá intimar o terceiro adquirente, que, se quiser, poderá opor embargos de terceiro, no prazo de 15 (quinze) dias.".

Dessa forma, sem dúvida, o enunciado foi recepcionado e reafirmado pelo CPC de 2015, estabelecendo que o reconhecimento da fraude à execução depende de prévia averbação do processo ou da construção judicial que recai sobre o bem alienado. Por sua vez o §4° do art. 828 do mesmo diploma legal considera fraude à execução a alienação ou oneração dos bens após essa averbação.

Aliás, o próprio STJ e também o TJRJ, em recentes julgados, reafirmaram a vigência do seu enunciado.

Portanto, a súmula permanece intacta e, inexistindo má fé e a prova do registro anterior, não se tem como configurar fraude à execução ou qualquer outro vício.

Apesar de muito tecnicismo, é importante que na aquisição de um bem, um imóvel, por exemplo, sempre se consulte um advogado especialista, para se constatar a inexistência de fraude à execução, pois se não provada a boa fé, corre-se o risco de perder seu patrimônio e cobrar o prejuízo do devedor (que vendeu o bem) pode não ter êxito, eis que já não tem meios de pagar suas dívidas.

É bom estarmos atentos.

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