Infração de medida sanitária preventiva

Dr. Guaraci de Campos Vianna - Foto: Divulgação

Seus Direitos na Justiça com Guaraci Campos Vianna
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Dr. Guaraci de Campos Vianna

Muitas discussões estão sendo travadas a respeito do Poder de Polícia dos Prefeitos e Governadores a respeito das medidas restritivas impostas por conta do covid-19.

Há casos em que o impasse chega as malhas da polícia e da Justiça, muito por conta da dissonância dos discursos das autoridades, especialistas e público em geral.

Sobre o tema é importante mencionar o art. 268 do Código Penal que diz: "Infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa: Pena - detenção, de um mês a um ano, e multa."

Pela quantidade da pena máxima (um ano), é constatado que se trata de um delito que protege a incolumidade pública (a saúde da coletividade) e é de menor potencial ofensivo, ou seja, da competência dos Juizados Especiais Criminais. É preciso esclarecer que recomendações são diferentes de determinações: no primeiro caso, como o cumprimento é facultativo, não há crime. Já as determinações são passíveis de penalização, ou seja, configuram crime.

Os fatos, então, precisão ser analisados caso a caso. O crime prevê apenas a forma dolosa. É necessário que o agente tenha conhecimento de determinação do Poder Público e tenha a intenção de descumprí-la.

A título de exemplo, praticará o crime de infração de medida sanitária preventiva o agente que, mesmo após receber determinação para que realize compulsoriamente exame médico, deixar de realizá-lo (artigo 3, III, "a", da Lei 13.979/20). De igual modo, se o agente isolado por determinação vier a fugir, também praticará o crime previsto no artigo 268 do Código Penal (artigo 3, I, da Lei 13.979/20).

Por se tratar de crime de perigo abstrato, a simples probabilidade de contágio causado à sociedade em virtude do descumprimento de determinação do poder público é suficiente para a caracterização do delito, ainda que desse descumprimento não resulte resultado concreto, posto que este perigo já foi considerado pela lei de maneira presumida (presunção absoluta).

É preciso destacar que a abordagem do "infrator deve observar as outras normas legais (inclusive o Enunciado da Súmula Vinculante do STF nº 11 que proíbe o uso de algemas).

É certo que o Direito Penal deve ser o último remédio para o acatamento do comando normativo de emergência para a Saúde Pública e, claro, que as autoridades públicas devem estar conscientes e sensíveis no sentido de que as medidas de quarentena, isolamento social as restrições nos transportes, no comércio e nas outras atividades em geral não podem gerar sequelas maiores do que o problema original. Com outras palavras, o excesso de remédios (ou o uso inadequado de medidas) não pode matar o doente, a curto, médio ou longo prazo.

É preciso e antecipar ou executar um cronograma de retorno à normalidade de forma gradativa. Por isso é preciso distinguir as recomendações das determinações e utilizar o bom senso de saber quando editar normas imperativas, destinadas apenas em situações onde o risco é maior. Ponderar todos os interesses em jogo, como a liberdade, a sobrevivência econômica e as questões de saúde pública são mais do que necessárias, são imprescindíveis.

O crime de infração de medida sanitária preventiva visa fortalecer as ações de prevenção contra as doenças contagiosas, por meio da gestão penal de riscos. Esses devem sopesar tudo o que está envolvido. Como se trata de norma penal em branco, os atos normativos do Executivo devem ser adequados e atualizados sempre.

Mas, como se disse, é preciso ter bom senso. Sem dúvida, a pessoa sintomática ou já diagnosticada com Covid-19 deve estar em isolamento compulsório e, se o violar, incorre na prática do crime em questão. Da mesma forma incide no tipo penal quem promove uma festa para dezena de pessoas. Mas simplesmente transitar dentro do bairro onde mora não pode, por si só, configurar crime. Também devem ser considerados as excludentes penais, como o estado de necessidade.

Todavia, é muito improvável que passado esse período, o crime de medida sanitária preventiva adquira relevância no cenário jurídico nacional diante da verdadeira pandemia de normas contraditórias emanadas do governo Federal, dos governos estaduais e municipais. O assunto não deveria ser politizado e nem judicializado, mas sim objeto de um consenso nacional em prol do povo brasileiro.