Fiocruz: em atividade 24h por dia no combate ao coronavírus

A Fiocruz construiu em menos de dois meses uma unidade hospitalar destinada a pacientes graves contaminados pela doença, localizada em Manguinhos - Foto: Leonardo Oliveira/Fiocruz

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A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) tem se destacado na elaboração de estratégias para combate e prevenção ao novo coronavírus. Além de estudos em andamento para a produção de medicamentos, a instituição também tem atuação na área social e construiu um centro hospitalar para ampliar a capacidade de leitos disponíveis para pacientes com a covid-19.

De acordo com o sanitarista Christovam Barcellos, especializado em informação da saúde e membro do Observatório da covid-19 na Fiocruz, o trabalho realizado pelos profissionais da instituição é intenso. No entanto, alguns processos de pesquisa requerem mais atenção, por isso avançam de forma mais lenta.

"Estão em andamento diversas pesquisas de vacina, medicamentos, a Fiocruz construiu um hospital de campanha que já está funcionando, trabalhamos em modelagem matemática para previsão para as próximas semanas de pandemia. Também temos trabalhado com as populações vulneráveis, em estratégias de atenção à saúde, que é para onde a pandemia vai para as próximas semanas. Uma tradição da Fiocruz é uma cooperação internacional muito intensa e estamos avançando, trabalhando 24h por dia, mas infelizmente alguns processos de pesquisa são muito lentos", disse Barcellos.

O sanitarista também destacou o trabalho realizado na resposta de dúvidas enviadas pelos cidadãos e o fato de algumas delas se tornarem trabalhos de pesquisa na Fiocruz. Aliado a isso, a instituição também tem trabalhado no combate à desinformação, ou seja, notícias falsas sobre a pandemia que acabam se propagando.

"A principal função do site da Fiocruz tem sido responder dúvidas, algumas ainda sem respostas, mas as próprias perguntas são um desafio. Algumas são transformadas em agenda de pesquisa. As fake news nos atrapalham muito, às vezes são brincadeiras, dúvidas ou pessoas mal intencionadas querendo confundir, por isso um dos trabalhos da Fiocruz tem sido o combate à desinformação", afirmou.

Isolamento social - No começo de maio, a Fiocruz enviou relatório ao Ministério Público Estadual (MPRJ) recomendando medidas de isolamento social mais rígidas no estado. De acordo com Christovam Barcellos, a instituição mantém o posicionamento. O sanitarista ainda se manifestou contrário à flexibilização das restrições.

"A expressão isolamento social pode ser usada de diversas maneiras. A mais radical é chamada de lockdown, onde só se pode sair de casa com justificativa. A posição da Fiocruz é de que é inevitável uma medida mais dura de restrição à mobilidade, agora como isso vai ser desenhado depende muito de cada lugar e da própria dinâmica da pandemia. No Brasil todo estamos na fase de crescimento, enquanto na Europa e no Oriente está em outra fase. A Fiocruz recomendou medidas mais duras de isolamento e esse desenho é complexo, têm providências a serem tomadas em diversos aspectos como saúde, transporte, economia e assistência social. O que a Fiocruz está dizendo é que não é possível flexibilizar as medidas", pontuou Barcellos.

O sanitarista defendeu que as medidas restritivas sejam planejadas de forma regional. Ele deu como exemplo uma cidade no qual o número de casos e mortes seja baixo, mas um município vizinho possui situação oposta, tendo seu sistema de saúde sobrecarregado. Para o profissional, o planejamento deve ser feito em conjunto.

"A Fiocruz está insistindo que esse planejamento (para a pandemia) deve ser regional. Um Município depende do outro e as pessoas circulam entre eles. Um município que tem poucos casos, perto de outro com muitos, não está livre da pandemia e isso exige um planejamento mais regionalizado. Por último, caberia ao governo federal estabelecer uma diretriz geral com fornecimento de insumos, testes laboratoriais, equipamentos de proteção e regulação de leitos", destacou.

Testes e subnotificação - Uma das maiores dificuldades do país na pandemia é a baixa testagem da população. A Fiocruz também trabalha para melhorar esta situação e, até o dia 14 de maio, já havia disponibilizado para a rede pública 2 milhões de testes moleculares, em conjunto com o Instituto de Biologia Molecular do Paraná (IBMP).

Christovam Barcellos além de destacar o trabalho realizado na instituição, também apontou para a colaboração internacional. Recentemente, a Fiocruz recebeu uma remessa de testes da Organização Mundial da Saúde (OMS). Ainda assim, o número é insuficiente, o que, para o sanitarista, atrapalha na elaboração das medidas de isolamento.

"A pessoa que testar positivo deveria ter um isolamento especial, todos os objetos da casa onde ela esteja deveriam ser higienizados por pelo menos 14 dias, que é o período que ela pode transmitir e isso evita que ela transmita o vírus dentro de casa, além de evitar que ela vá para a rua. Quem esteve em contato com a pessoa que testou positivo deveria ser orientada e isso infelizmente está falhando. Não só causa a subnotificação como também o quadro de saúde das comunidades fica invisível, não se sabe se o vírus chegou a um determinado lugar. E isso é fundamental para tomada de decisões de afrouxamento ou não do isolamento", alertou o sanitarista.

Uma solução apontada por Barcellos para 'driblar' a falta de testes é um acompanhamento realizado por equipes de médicos de família. O sanitarista citou a cidade de Niterói como exemplo positivo, mas lamentou que em outros municípios, em todo o Brasil, programas do tipo tenham sido desmontados.

"Alguns países também tiveram problemas com testes e adotaram outras tecnologias, como por exemplo um acompanhamento quase que de pessoa por pessoa que tiveram algum tipo de sintoma que possa ser relacionado à covid, mesmo sem teste. É feito um questionário social. O Brasil chegou a ter programas de médico de família que tem um profissional que atende próximo de onde às pessoas moram com toda uma equipe que iria de casa em casa perguntar como estão as pessoas. Niterói é um bom exemplo disso. Esse acompanhamento seria uma estratégia para 'driblar' a falta de testes. Infelizmente esse programa foi desmontado em vários lugares do país. Isso evitaria que pessoas fossem a hospitais sem necessidade", afirmou o profissional.

Cloroquina, medicamentos e vacinas - O Ministério da Saúde divulgou, na quarta-feira (20), o novo protocolo para a utilização da cloroquina, recomendando a prescrição do medicamento para pacientes com sintomas leves da doença. De acordo com Barcellos, a medida não é positiva, por conta da não comprovação da eficácia no tratamento da covid-19, além dos possíveis efeitos colaterais.

"Desde o começo de abril a Fiocruz lançou uma nota técnica afirmando que a cloroquina pode ter efeitos colaterais. Depois outras sociedades científicas fizeram estudos mostrando que não existe comprovação de que seria um tratamento adequado, suficiente e eficaz para a covid-19. A maior parte dos estudos está afirmando que não existe um impacto muito positivo ou diferença de resultado entre pessoas que tomam e não tomam. O Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), que tem maior capacidade de controle do SUS, diz que é um absurdo o Ministério da Saúde liberar a cloroquina. Foi uma decisão que não passou por nenhuma sociedade científica", alertou o profissional.

A Fiocruz trabalha em estudos com a combinação de medicamentos já existentes para tentar tratar a covid-19. Além disso, a instituição está trabalhando em colaboração com órgãos internacionais em pesquisas para o desenvolvimento de uma vacina que previna contra o novo coronavírus.

"Nesse primeiro momento não é possível produzir um medicamento novo. O que está sendo testado é uma combinação de medicamentos já existentes. A covid-19 não é apenas uma doença pulmonar, é um processo inflamatório que também atinge rins e sistema nervoso. O que a Fiocruz tem feito são testes com combinações de medicamentos que inibem inflamação e ativam o sistema imunológico. Mas ainda não temos isso com eficácia comprovada", concluiu Christovam Barcellos.

Centro Hospitalar - A Fiocruz construiu em menos de dois meses uma unidade hospitalar destinada a pacientes graves contaminados pela doença. Localizado em Manguinhos, sede da Fundação no Rio de Janeiro, o Centro Hospitalar para a Pandemia de Covid-19 - Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz) começou a receber, na terça-feira (19), os primeiros pacientes transferidos pela central estadual de regulação de vagas.

Os leitos serão ocupados gradualmente, a partir da avaliação diária e conjunta da direção com as secretarias municipal e estadual de saúde. A medida garante as condições de segurança necessárias tanto para pacientes quanto para os profissionais de saúde. O complexo, que ocupa uma área total de 9,8 mil metros quadrados, também conta com entrada exclusiva para ambulâncias e heliponto. Em seu pleno funcionamento, serão 195 leitos destinados ao tratamento intensivo e semi-intensivo.

Mestrado e doutorado voltado para a covid-19 - O Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas está com inscrições abertas, até esta segunda-feira (25), para o processo seletivo 2020 dos cursos de Mestrado Acadêmico e Doutorado do Programa em Pesquisa Clínica em Doenças Infecciosas. Atendendo a Ação Emergencial da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), a seleção pública extraordinária é destinada a projetos que induzam a geração de conhecimento prático e específico orientado especialmente à prevenção e ao combate da atual pandemia da covid-19, ou endemias e epidemias em geral que assolam o país, envolvendo áreas tais como infectologia, epidemiologia, imunologia, microbiologia, biotecnologia, ou correlatas, cujos conhecimentos possam compor esforços coordenados de atuação perante tais situações.

O programa do INI busca formar docentes para o ensino de nível superior e pesquisadores qualificados para o desenvolvimento de pesquisa clínica em doenças infecciosas. Para o curso de mestrado acadêmico estão disponíveis quatro vagas, com duração máxima de 24 meses. Já para o doutorado, também são ofertadas quatro vagas, e duração máxima de 48 meses e mínima de 24 meses. O regime de ambos os cursos é de tempo integral.