Ciência em busca de soluções

Cavalos do Instituto Vital Brazil, em Niterói, ajudam na produção de soro anti-covid-19. Patente já foi apresentada à Academia Nacional de Medicina - Foto: Arquivo/Instituto Vital Brazil

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A pandemia causada pelo novo coronavírus provocou uma corrida das comunidades científica e médica pela busca de soluções para a cura e o tratamento da doença, até então desconhecida de grande parte da população mundial. No Rio de Janeiro, as diversas ações fomentadas pelo Governo do Estado ajudaram instituições de pesquisa e unidades de saúde que, juntas, entraram em ação e já estão produzindo alguns resultados significativos.

Uma das iniciativas mais promissoras é o soro anticovid-19 desenvolvido pelo Instituto Vital Brazil, ligado à Secretaria de Estado de Saúde, e funcionando há mais de 100 anos em Niterói. No dia 13 de agosto, a patente da substância foi apresentada à Academia Nacional de Medicina, juntamente com os resultados das pesquisas com os soros produzidos por cavalos para o tratamento da Covid-19.

"O Instituto Vital Brazil recebe todo o apoio e investimento à pesquisa. Nós aliamos toda a nossa expertise na produção de soros de mais de um século ao experimento com o plasma dos cavalos, o que permite que o tratamento seja produzido em grande escala. Os animais não sofrem com o processo de retirada de plasma e, conseguimos assim, uma grande quantidade de medicamento disponível", explicou Adilson Stolet, presidente do instituto.

O processo - Depois de 70 dias, os plasmas de quatro dos cinco cavalos do Instituto Vital Brazil, inoculados em maio de 2020 com a proteína S recombinante do coronavírus, produzida na Coppe/UFRJ, apresentaram anticorpos neutralizantes 20 a 50 vezes mais potentes contra o novo vírus do que os plasmas de pessoas que tiveram a doença. Foi criado, então, o soro anticovid-19, produzido a partir de equinos imunizados com a glicoproteína recombinante da espícula do vírus.

O pedido de patente refere-se ao processo de produção do soro, preparação do antígeno, hiperimunização dos equinos, produção do plasma hiperimune, produção do concentrado de anticorpos específicos e do produto finalizado, após a sua purificação por filtração esterilizante e clarificação, envase e formulação final. O trabalho envolve parceria do Instituto Vital Brazil, UFRJ & Fiocruz e foi publicada na Biorxiv, uma revista da área científica.

"O próximo passo é a habilitação junto à Anvisa para o início dos testes clínicos. Nossa expectativa é a concordância da Agência para a testagem em pacientes, o que duraria cerca de dois meses. Na sequência, já estaremos preparados para a produção em larga escala. Aqui no Vital Brazil, já temos o anticorpo pronto para tratar o paciente", disse Stolet.

A pesquisa contou com apoio financeiro da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Rio de Janeiro (Faperj), do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep).

Enfermaria pós-Covid no Hupe - Entre as unidades de referência do Estado para o tratamento de pacientes com a Covid-19 está o Hospital Universitário Pedro Ernesto (Hupe), ligado à Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). Localizado em Vila Isabel, na Zona Norte da capital, a inovação da área médica focou no cuidado pós-doença - uma enfermaria pós-covid foi criada para atuar junto às patologias que poderiam ser consideradas sequelas do novo coronavírus.

"É uma iniciativa pioneira no SUS do Rio de Janeiro. Uma enfermaria especial, onde estão pacientes que se recuperaram da covid-19, mas tiveram sequelas em face desta doença. Por meio dos trabalhos dos profissionais de saúde desta enfermaria, os pacientes reaprendem a falar, andar, recuperam movimentos, a força muscular. O espaço vem se transformando em um local fundamental de reinserção à rotina social. Diria que, após a cura, eles têm uma oportunidade de readaptação à vida", explicou o diretor-geral do Hupe, Ronaldo Damião.

Teste rápido e barato - Pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) desenvolveram um teste sorológico para covid-19 que custa cerca de 20 vezes menos que os testes rápidos disponíveis em farmácias do Brasil. A metodologia, chamada de S-UFRJ, é resultado de uma parceria entre o Instituto de Biofísica e o Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-graduação e Pesquisa de Engenharia (Coppe).

O teste sorológico da UFRJ consegue captar anticorpos IgG (de longa duração) produzidos pelo corpo humano com precisão que chega a 100% após 20 dias do início dos sintomas. De acordo com os resultados, o método também é capaz de identificar anticorpos dez dias após os sintomas terem começado, mas a precisão cai para 90%.

A redução de custos se deve principalmente ao fato de que, apesar de ser do tipo Elisa (ensaio de imunoabsorção enzimática), o teste pode ser realizado com uma gota de sangue retirada da ponta do dedo. Uma das coordenadoras da pesquisa, a professora da Coppe Leda Castilho explica que esse modelo de coleta de amostras custa bem menos que extrair o sangue de uma veia do braço com uma seringa.

"Para tirar sangue da veia, você precisa ter uma estrutura laboratorial, operadores treinados da área da saúde e todo o material estéril, como a seringa e o tubo especial. Depois, tem que ter uma estrutura para separar o soro desse sangue", disse. "Nossa metodologia tem a coleta a partir de um furinho na ponta do dedo, e a amostra é embebida em um papel filtro, que, no limite, pode ser um filtro de café", acrescenta.

O custo dos insumos necessários para o teste não passa de R$ 2, quando considerada a saúde pública e organizações não governamentais com isenções tributárias. Apesar de um pouco maior, o custo baixo também vale para estabelecimentos privados, que conseguirão fazer o teste gastando R$ 5, calcularam os pesquisadores.

O objetivo da pesquisa é fazer com o que o teste sorológico seja mais acessível e também chegue a regiões com menor estrutura laboratorial, destacou a pesquisadora. Com a realização desse tipo de testes, é possível acompanhar a prevalência sorológica de populações mais distantes das capitais e em países de menor renda.

"O que a UFRJ oferece para a sociedade é um teste que pode ser feito na população ribeirinha do Amazonas, no meio do Cerrado ou no interior do sertão nordestino. E um teste que, além da alta confiabilidade e da simplicidade de coleta de amostra e processamento, tem um custo baixíssimo, de pelo menos 20 vezes menos que testes rápidos que têm sido realizados em farmácias e laboratórios do Brasil".

A metodologia para a realização do teste foi publicada cientificamente para ser replicada por institutos de pesquisa, empresas e governos de todo o mundo. Leda Castilho explica que a opção por não patentear e cobrar pela tecnologia faz parte da proposta de tornar o teste mais acessível. "A gente acha que, num horizonte de pandemia, as plataformas devem ser abertas para qualquer um em qualquer lugar do mundo", disse. Segundo ela, todo o processo de licenciamento também atrasaria a aplicação das descobertas no combate à pandemia. "Isso tem sido feito em todas as áreas e em todo o mundo. Não somos só nós que estamos fazendo isso".n