O fato jurídico mais relevante da última semana, sem dúvida alguma, foi a apresentação de denúncia pelo Procurador Geral da República contra o Presidente da República, em exercício, Michel Temer. Diante da enxurrada de escândalos que envolvem nossos atores políticos, pode ter passado desapercebido para muitos a relevância e gravidade da questão, sendo, agora, imperioso destacar do ponto de vista legal o que está ocorrendo.
Não é a primeira vez que um Presidente da República é criminalmente processado. O ex Presidente Fernando Collor de Mello também foi julgado e absolvido pelo Supremo Tribunal Federal, por, segundo o Ministério Público, participar de esquema de direcionamento de licitações para beneficiar determinadas empresas de publicidade em troca de benefícios pessoais e para terceiros. O suposto crime ocorreu nos idos de 1991/1992, mas o julgamento, relatado pela Ministra Carmen Lúcia, ocorreu apenas em 2014.
Algumas questões jurídicas chamam a atenção e nos fazem refletir a respeito do recente processo iniciado contra Michel Temer, aquele do Collor e, porque não, o julgamento político da Presidente Dilma Roussef. Fazer essa comparação importa em dificuldade até mesmo para aqueles que vivem no meio jurídico. Imagino como não deve estar a cabeça do leigo. Vamos tentar desfazer alguns nós.
A grande e principal diferença é que naquele momento em que foi julgado (e absolvido, repise-se) Collor de Mello não se sentava mais na cadeira de Presidente da República, pois havia sido cassado em processo de impeachment, semelhante ao que sofreu a Presidente Dilma. Dilma e Collor foram afastados pelo Congresso e depois julgados pelo Senado.
A questão principal é: não podemos confundir o julgamento realizado pelo Legislativo e que se convencionou chamar de impeachment e tem efeitos políticos com o julgamento realizado pelo Judiciário pela prática de um crime e pode levar o acusado a prisão, se condenado. Curioso é imaginar que o Legislativo pode concluir que houve crime e afastar o Presidente, mas o Ministério Público pode entender de forma diferente e não denunciá-lo. Tudo por conta da sagrada independência entre os Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) estabelecida na Constituição Federal.
Mais uma vez, como é costume de nossa coluna, vamos nos restringir à análise jurídica da questão, sem adentrar às questões políticas, que podem criar uma desnecessária neblina de pensamento a ponto de impedir o necessário debate de ideias, capaz de, quem sabe, (quanta pretensão a minha) conseguir formar um pensamento capaz de tornar o leigo um pouco mais crítico.
No caso do Temer, denunciado na semana passada, de acordo com o chefe do Ministério Público Federal existem indícios suficientes para a propositura de uma ação penal pela prática de corrupção passiva. Na ação proposta, além da condenação criminal é requerida ainda a perda da função pública, do dinheiro obtido de forma ilícita e a condenação do atual Presidente a reparar os danos extrapatrimonais causados.
Ainda que a imprensa e o próprio Procurador Geral da República dê ar de condenação sumária, necessário destacar que o processo encontra-se ainda em sua fase inicial. Depois da chegada da denúncia pelo Supremo Tribunal Federal, o pedido será submetido a Câmara dos Deputados, que decidirá pelo efetivo início ou não do processo. Em suma, o STF recebe e espera a decisão do Congresso e só depois disso analisa se a denúncia deve ser recebida.
Temer precisa agora convencer os Deputados de que não praticou qualquer ilícito, como alega o Ministério Público, uma vez que a ação apenas se inicia se 2/3 dos integrantes dos membros do Congresso votarem contra o Presidente em exercício. Caso seja admitida a demanda, ainda segundo as regras estabelecidas pela Constituição, Temer será afastado, assumindo o Presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia.
Esse é o cenário político-jurídico da principal questão de nosso desgastado e humilhado país. Talvez a pergunta mais difícil de responder nesse momento seja o que devemos, enquanto cidadãos, fazer. Fugir? Fingir de morto? Ir às ruas e exigir que, a exemplo dos anteriores, o afastamento do Presidente? Pelo menos (ainda) somos livres para decidir.
Dúvidas sobre seu direito? Mande uma mensagem para nós –hugopenna@ch.adv.br e será um prazer ajudá-lo. Até a próxima, sem juridiquês.