Evidenciadas as relações delituosas do golpista Michel Temer com a JBS, um dos conglomerados empresariais que capturaram o Estado brasileiro, a queda do usurpador, por renúncia, cassação ou impedimento, é iminente e inevitável. Assim, faz-se prioritário assegurar que a sua sucessão seja efetuada nos marcos do empoderamento popular, através de eleições livres e diretas. Com efeito, causa espanto admitir que o atual Congresso Nacional, amplamente desmoralizado e socialmente rejeitado, transforme-se em colégio eleitoral e defina, por escolha indireta, o(a) novo(a) presidente da República.
Em contraponto a essa ideia, alguns brandirão o texto constitucional, que de fato determina, em caso de vacância dos cargos de presidente e de vice-presidente da República, na segunda metade do quadriênio, que o Congresso Nacional escolha indiretamente o(a) sucessor(a). Contudo, nesta hora tão grave da vida nacional, é imperioso fortalecer o poder popular, principal fonte da democracia. Apenas o primado da soberania popular poderá permitir que o Brasil comece a sair da profunda crise política e institucional em que estamos colocados. A Constituição pode ser emendada pelo Congresso Nacional, posto que a matéria em foco, sucessão presidencial em caso de vacância, não é cláusula pétrea, logo, não requer o concurso de um poder constitucional originário para modificá-la. Ademais, embora a nossa Carta Magna preveja, no caso em tela, a escolha indireta por deputados federais e senadores, convenhamos, esta alternativa, face à conjuntura atual, é, no mínimo, imoral, além de ilegítima, porquanto desprovida de qualquer apoio popular.
Em 1984, nos estertores da ditadura civil-militar, ainda militante e dirigente do movimento estudantil na Universidade Federal Fluminense, estive na Candelária, lutando por “Diretas Já” e, especificamente, pela aprovação da Emenda Constitucional de autoria do então deputado federal, pelo Mato Grosso, Dante de Oliveira. Nunca pensei que, mais de trinta anos depois, seria necessário voltar às ruas para lutar por eleições diretas para presidente no Brasil. Isso mostra a justeza da argumentação de Carlos Nelson Coutinho, quando insistia que era mais adequado empregar o vocábulo “democratização”, em vez de “democracia”, para que tivéssemos a noção precisa de que a democracia está sempre incompleta, inacabada, imperfeita.
Para ressaltar que a democracia é sempre uma processualidade instituinte, e não uma realidade conclusivamente instituída. Foi o que fizemos no último domingo, na Praia de Copacabana: voltamos às ruas para lutar por Diretas Já. Não foi um mero repeteco histórico, pois a história só se repete “como tragédia ou farsa”. Vivemos hoje uma conjuntura distinta, bem distinta, daquela em que vivíamos em 1984, do ponto de vista do processo democrático no Brasil. Naquela primeira metade dos anos oitenta, o Brasil experienciava mais um período histórico de redemocratização: reorganização dos movimentos sociais, superação do binarismo partidário consentido e reestruturação da vida partidária, anistia política aos cassados e exilados, chegando ao marco desta etapa histórica, com a promulgação da Constituição dita “Cidadã”, em 1988. Hoje, ao contrário, estamos sob uma terrível ofensiva contra o Estado Democrático de Direito, que derrubou uma presidenta legitimamente reeleita pelo voto popular, que vem confiscando direitos e constrangendo liberdades fundamentais, que tem dado guarida a pensamentos obscurantistas, alguns em estreito diálogo com matrizes do pensamento nazifascista. Como no ditado popular, “a voz do povo é a voz de Deus”: diretas já!
Clamor popular: diretas já!
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