E o foro privilegiado?

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Em julgamento ainda não concluído, a maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal, STF, decidiu a favor da restrição do foro privilegiado concedido a parlamentares apenas a casos relacionados a crimes cometidos durante e em razão do exercício do cargo. Após sete votos a favor da restrição do benefício concedido aos políticos, o julgamento foi interrompido por pedido de vista do ministro Dias Toffoli.

Assim que concluído o julgamento pelo STF, os crimes comuns praticados por autoridades públicas serão julgados pelas Varas Criminais, estaduais e federais, nos locais onde os delitos foram praticados, permanecendo as Cortes Superiores com a atribuição de julgar apenas os crimes praticados no exercício de suas funções públicas. Assim se um Deputado dirigindo embriagado matar alguém atropelado, será julgado pelo Tribunal do Júri e não por um Tribunal Superior.

O foro privilegiado, ou como também costuma ser chamado, foro por prerrogativa de função trata-se de um privilégio concedido a autoridades de serem julgadas por um tribunal diferente ao de primeira instância, onde é julgada a maioria dos brasileiros que cometem crimes. Trata-se de uma vantagem estabelecida na própria Constituição Federal que agora, pode o STF interpretar para restringir apenas aos delitos praticados por tais autoridades no exercício de suas funções.

Em uma turma de direito, falar sobre o foro privilegiado não é tarefa das mais fáceis, uma vez que, assim como ocorre com o leigo, é natural no acadêmico, a inquietação diante de vantagens que são conferidas a determinadas pessoas por conta da função ou cargo que ocupa. Em relação ao foro de prerrogativa, ainda é peculiar a tentativa de explicar que não ter, ao menos, mais uma instância julgadora é uma vantagem e não um prejuízo.

É de rigor destacar que a Constituição Federal assegura a igualdade de todos perante a lei como direito fundamental. Trata-se do princípio da isonomia há muito consagrado pelo direito e que, entre nós, teve Rui Barbosa com seu principal expoente. Partindo da premissa que todos são iguais é natural esperar que todos tenham as mesmas oportunidades nos processos aos quais sejam submetidos.

Árdua é a tarefa de defender que os privilégios processuais previstos em nossa legislação, na grande maioria das vezes, são, não apenas importantes, mas até necessários. Dois são os fundamentos comumente utilizados para que a lei estabeleça um tratamento distinto a uma das partes do processo, em detrimento do outro: a necessidade de proteger o mais fraco e o interesse público. Explico.

A igualdade não pode ser interpretada de forma literal, mas sim de modo a conferir um tratamento idêntico àquelas pessoas que se encontrem na mesma condição e um tratamento diferenciado para os sujeitos que estejam em condições de desequilíbrio. À guisa de exemplo podemos citar que normalmente as pessoas são obrigadas a pagar ao Estado para propor uma ação de natureza cível que não seja de competência dos Juizados Especiais. Aqueles que não tiverem condições de pagar (se o juiz deferir o benefício da gratuidade de justiça) serão dispensados de realizar o pagamento.

Sem dúvida o argumento da vulnerabilidade não pode ser utilizado para justificar as vantagens processuais de Deputados, Senadores, Presidente da República, Governadores. Sem dúvida, a única coisa que nossas autoridades diante de tantas regalias e vantagens custeadas por nossa população, jamais poderão alegar que precisam de vantagens nos processos que responderem por terem uma vida sofrida e miserável.

Suas Excelências, acostumadas com carros oficiais, motoristas, elevadores privativos, assessores, tapetes vermelhos e tudo o que acreditam terem conquistado pelo voto, não gozam de vantagens quando são processadas porque são vulneráveis, mas sim pela manutenção covarde de suas regalias. Em nome do pretenso “interesse público” protegem-se às custas de uma elevada carga tributária, necessária para manter a pompa e circunstância dignas de um nobre nos tempos de império.

O privilégio de serem processados diretamente em um Tribunal, preferencialmente por Tribunais Superiores, e não terem suas ações julgadas originariamente por um juiz de 1ª instância, consiste em vantagem exatamente porque os Tribunais, historicamente, têm dificuldade para condenar autoridades. E isso deve-se por motivos mais variados, desde a inaptidão com o procedimento do processo criminal até as influências políticas que indubitavelmente os julgadores podem sofrer.

A decisão do STF, comentada no início da coluna e que ansiosamente se aguarda, surge como uma luz no final do túnel. Quem sabe em um ano marcado por tanta impopularidade de seus Ministros, a Corte Suprema consiga dar as autoridades o mesmo tratamento que costuma ser dado aos pobres mortais brasileiros.

Dúvidas sobre seu direito? Mande uma mensagem para nós –[email protected] e será um prazer ajudá-lo. Até a próxima, sem juridiquês.