Educação de surdos: ainda um desafio

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Desde 1998, ano de sua primeira edição, o tema da redação do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) sempre provoca interessantes debates, por vezes acalorados. Neste ano, a polêmica antecedeu a divulgação do tema, tendo em vista a decisão do STF de não eliminar candidatos cujas redações contivessem conteúdos atentatórios aos direitos humanos. Suprema e lamentável condescendência com o racismo, o sexismo, a homofobia, o nazismo, entre outras pautas desprezíveis. Afinal, jovens não devem ser estimulados a dissertar, de forma odiosa e intolerante, sobre qualquer tema.

Mas o bom tema da redação do ENEM 2017, uma vez divulgado, suscitou saudável debate: “Desafios para a formação educacional de surdos no Brasil”. De saída, o tema provoca reflexões sobre duas importantes questões: o respeito à diversidade e a inclusão de pessoas com deficiência, em especial da pessoa surda, notadamente no campo escolar. Ora, neste momento de temerário ascenso do pensamento obscurantista, no Brasil e no mundo, pautar um tema que conduz inequivocamente ao debate sobre a diversidade, ou seja, sobre a compreensão de que diferença não é déficit nem patologia, já é, por si só, meritório.

Se o gancho para essa discussão for a inclusão educacional da pessoa com deficiência, no caso, da pessoa surda, amplia-se a dimensão positiva da temática. Aliás, trata-se aqui do conteúdo da Meta 4, do Plano Nacional de Educação (Lei 13.005/14), que aponta como tendência prevalente a inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais nas chamadas classes regulares. Mas isso não pode ocorrer sob o signo do arremedo nem da improvisação. Não basta o discurso da inclusão. É preciso assegurar condições objetivas para que ela se materialize no cotidiano escolar.

No caso da educação de surdos, embora tenhamos uma instituição federal de referência, o Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES), com 160 anos de existência, que desenvolve, entre outras iniciativas, o desafiador e pioneiro projeto de um Curso de Licenciatura em Pedagogia Bilíngue, para surdos e ouvintes, a escola brasileira ainda está longe de uma efetiva inclusão. Não apenas de surdos, mas do conjunto de alunos com necessidades educacionais especiais. No caso específico dos alunos surdos, a apropriação da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) requer a realização de atividades pedagógicas no ambiente surdo, com ênfase na cultura surda. Aliás, a aquisição de uma língua, não como língua estrangeira, mas como língua materna, sempre requer o ambiente sócio-linguístico correspondente ao idioma materno.

Ademais, uma vez integrados às escolas regulares, já fluentes em LIBRAS, os alunos surdos precisam encontrar um ambiente escolar que os acolha na sua diversidade linguística e cultural. Não basta assegurar-lhes a matrícula, pois apenas isso não configura efetiva inclusão. Professores proficientes em LIBRAS, presença de intérpretes e atividades pedagógicas sempre atentas, no conteúdo e na forma, à diversidade linguística existente na escola são imprescindíveis à inclusão. Importa destacar a centralidade de se inserir, nos cursos de formação de professores, seja em nível médio (na modalidade normal), seja em cursos de licenciatura, componentes curriculares que pautem com densidade o debate sobre a inclusão de alunos com deficiência, bem como garantam ao futuro professor certo nível de proficiência em LIBRAS.

O Brasil já tem lei e decreto que reconhecem o caráter oficial da LIBRAS, lei que institui a inclusão da pessoa com deficiência, plano nacional de educação que tem como uma das metas a inclusão de alunos com deficiência. Agora, precisamos de recursos que viabilizem a implantação de políticas de inclusão da pessoa com deficiência, dentro e fora da escola, de modo que as teorias da inclusão tenham aplicabilidade prática e, com isso, se aperfeiçoem; e de sorte que as leis que sustentam a inclusão não virem letra morta na legislação brasileira.