A chave do coração

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Temos acompanhado o desenvolvimento humano e as descobertas espirituais de uma jovem esposa greco-romana, criada pela nossa ficção, mas que bem poderia ter existido. Pensando bem, quem sabe, por que não?

Ela sabia o que esperar de uma mensagem religiosa: esperava uma ultrapassagem da condição humana, um modelo ideal, com o qual se identificasse, para encontrar a dignidade perdida, uma doutrina que respondesse aos enigmas da existência, consolasse a miséria, tornasse suportáveis a doença, o sofrimento, a morte. 

Hoje em dia, espera-se mensageiros religiosos que prometam milagres e realizem prodígios. 

Paulo já enfrentava esse fenômeno nas comunidades de seu tempo: uma rude concorrência no mercado da espiritualidade, o mercado das consolações fáceis e das promessas de prosperidade imediatas. Ele dizia que a Verdade que fora encarregado de anunciar não era um produto competitivo. Ela não tinha nada de extraordinário, em si mesma, nenhuma ferramenta prática para resolver problemas cotidianos, nenhum brilhante sistema filosófico para admirar, nada de profundos mistérios para sondar, nada de curas em linha de produção. 

Mas ela era, em si mesma, extraordinária. Somos uma nova criação de um novo mundo – dizia Paulo. Por pura graça, por nada e a partir do nada - nem sangue nem ciência nem patrimônio - Deus nos fez para ele, completamente únicos. 

Foi essa estupenda novidade que encantou nossa jovem senhora.  

Essa novidade se chamava Evangelho de Jesus Cristo. Significava o nascimento de uma nova consciência de si e do mundo, a descoberta radical e libertadora de uma verdade, que a subjetividade daquele que crê mantém consigo mesmo. Essa nova consciência plena era uma mudança, que só poderia ser operada quando, e se, o homem mergulhasse no seu interior, guiado pela mão do Espírito. 

A jovem senhora grega reconheceu nas palavras de Paulo um desejo antigo, um anseio ainda maior do que o das plantas, por água.
Ela sabia que cada um atravessa a banalidade cotidiana levado por automatismos e hábitos, e isso não é portador de novidade alguma. O desenrolar da vida é igual ao passar dos dias. Tudo se repete! A rotina interfere até na retina: ela modifica o que nos capacitamos a enxergar. As boas resoluções são boas, sim, mas não bastam. Elas podem criar a ilusão de segurança, apaziguadora de uma mudança que, na verdade, nunca chega.

Ela recebeu de Paulo a garantia de que essa nova consciência derruba os limites entre o possível e o sonho; ela tem o poder transformador das evidências. Força a imaginação, ilumina a inteligência, empurra a vontade. Embora nova, ela age em nós como se sempre tivesse estado lá. Ela cria raízes em nós e nos desenraiza. Nada muda e, no entanto, tudo é novo. 

Era por isso que a jovem senhora grega sempre ansiou. Era tudo novo, com a irradiância que o novo tem. 

Uma palavra repetida voltou com ela para casa: a palavra era mudança. E foi a chave do seu coração.

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