O (alto) preço de viver numa metrópole

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Quando eu ainda era um simples aluno na Academia Nacional de Polícia, ficava irado ao ouvir dos instrutores que Rio de Janeiro e São Paulo eram diferentes do resto do Brasil. Que a polícia nesses dois lugares era algo à parte, que seguia regras próprias e que não se guiava pelo bom senso.

Saí da Academia direto para o Rio de Janeiro. Rapidamente elegi os policiais mais antigos como meus heróis e travei laços de companheirismo fortes com os colegas de São Paulo. “Aqueles instrutores eram uns retardados”, eu pensava. Por outro lado, percebi que éramos mesmo uma polícia dentro da polícia. Métodos próprios e uma forma peculiar de lidar com o crime. Um orgulho grande sempre me acompanhou, por pertencer a esse time de policiais das duas grandes metrópoles do Brasil. Diferentes de todos.

Então o tempo passou e essa análise do comportamento nas megalópoles transpôs os portões das instituições policiais. Ao mergulhar no mundo das comunidades que atinjo com o projeto social que coordeno, bem como a forma com a qual seus habitantes se comportam, ficou evidente para mim, que pagamos um preço alto por termos escolhido viver nas duas maiores vitrines do Brasil para o mundo.

Somos um Brasil dentro de outro Brasil. Andando pelo país nos últimos tempos, fiquei chocado ao assistir em noticiários locais de capitais distantes do eixo Rio-São Paulo, matérias que davam conta de roubos de celulares ou acidentes de moto. Vocês, amigos leitores, têm ideia do quanto fatos como esses são corriqueiros para nós, ao ponto de nem passarem mais perto das manchetes dos jornais? Certamente sabem que enquanto leem esta coluna mais de uma dezena de celulares está sendo roubada nas ruas cariocas e paulistanas.

Indo mais longe na análise, deparei-me com iniciativas como a de um comerciante de Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, que mantém um estabelecimento há mais de 30 anos, no qual o cliente entra, pega os salgados e bebidas que vai comer e informa, por sua conta, o que foi consumido no caixa. Um negócio que dá tão certo, que só faz se expandir, sendo uma referência na cidade.

Pararam para imaginar tal iniciativa por aqui, no RJ, ou em nosso vizinho São Paulo? Será que teria prosperado? Será que as pessoas diriam exatamente quanto consumiram? Sinceramente, por tudo o que vejo diariamente ao meu redor, aposto minhas fichas que um comércio semelhante não suportaria um ano de funcionamento. Se o senhor Thomaz, dono do estabelecimento do Mato Grosso do Sul tentasse abrir sua loja aqui, seguramente já teria voltado para Campo Grande.

E por aí, neste mesmo Brasil, vi cidades organizadas, com poucos moradores de rua, com trânsitos que andam mesmo em horas de pico, com serviços públicos que atendem com eficiência o cidadão. Por que?

Meus instrutores da Academia Nacional de Polícia estavam certos. Aprendemos no Rio e em São Paulo, a sermos o que há de melhor e o que há de pior em termos de comportamento. É uma caraterística nossa. Secular. Que apenas nós podemos mudar em nós mesmos.