Uma história comprida

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Na semana passada, eu analisava como se deu a incrível difusão da notícia da Ressurreição de Jesus. Havia dito que do ponto de vista histórico, aquela morte não tinha passado de um fato corriqueiro do Império Romano. Há quem diga que se a história mundial fosse uma enorme tela eletrônica, aquele acontecimento não passaria de um pixel perdido, ou seja, aquele ponto menor perdido num dos cantos da tela.

Como entender, portanto, que um acontecimento isolado, num rincão perdido do mundo, tenha alcançado o coração da Roma pagã e estimulado tantos a prosseguirem numa jornada diferente?

Observem que a fé cristã brota e cresce, no mesmo momento em que Roma engatinha como império e, também, brota e cresce. Jesus nasce sob Augusto, o primeiro imperador romano; e morre sob Tibério, o segundo. É imprescindível que se tenha isso em mente, para entender o desabrochar da fé que foi iluminada pelo sol de primavera da Judeia, na manhã da Ressurreição.

É que Roma, apesar de ter alimentado a noção do homem como cidadão, pouco se interessou pelo indivíduo. Tampouco, os deuses do panteão romano se interessavam. Herdeiros do mito grego, mas, consideravelmente, torneados ao interesse público, também eles não focavam a singularidade do indivíduo. Júpiter, Juno, Apolo, Diana pouco ligavam para as dores de seus adoradores. Cabia a eles, enquanto deuses, cuidar do futuro do Estado. A finalidade de organizar celebrações e queimar incenso, em sua honra, era para que o Estado Romano prosperasse. Só isso!

Mas se um adorador perdesse um filho, por exemplo, não havia a quem chorar, nem por quem implorar. O cidadão romano era cidadão em tudo, menos na sua dor. Ele podia se orgulhar de pertencer ao grande império, desde que tudo lhe corresse bem. Podia trombetear aos quatro ventos que seus deuses eram mais glamourosos que os outros. Mas ele mesmo, enquanto pessoa, vivia sozinho, na hora de viver; na hora de morrer, morria sozinho. Talvez seus deuses lhe dessem proteção, mas jamais consolo. Distantes demais da vida comum, eles tinham coisas mais importantes a fazer. 

Daí que quando uma jovem seita semita começa a semear um novo jeito de ver as coisas e, sobretudo, de ver-se a si mesmo, era inevitável que o mundo virasse de cabeça pra baixo. E justamente, quem trazia o anúncio da novidade eram os de baixo, os escravos. Foi entre eles que começou a se alastrar o boato de que um pregador da Judeia, totalmente brutalizado em sua condição humana, justamente, pelos poderes que mantinham o império de pé, e que também os brutalizava, havia sido morto e havia ressuscitado. 

E mais! 

Que ele se interessava, pessoalmente, pela sorte de cada um. Coisa a que os deuses romanos jamais se haviam dado o trabalho. 

E mais!

Que ele se identificava, pessoalmente, com a vida de cada um. Tanto que havia sido torturado e morto como um deles, um escravo. 

Isso era demais! Não era?

Mas essa história ficou tão comprida que preciso retornar na semana que vem.

Acho que terei de voltar ao assunto.