Desejo: aceitação e respeito

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O documentário “Vida de Rainha”, de Luciana Avellar, destaca o subúrbio carioca

Fotos: Divulgação

No ano de 1939, Judy Garland interpretava a clássica “Over the rainbow”, no longa “Mágico de Oz”. A canção foi absorvida pela comunidade gay, se tornando um dos primeiros hinos gays da história. Diz a lenda que a música inspirou a criação da bandeira do movimento LGBT. O cinema se tornou uma mídia que veio ao encontro do desejo por aceitação.

O “Rio Festival de Gêneros e Sexualidades 2016” chega a Niterói como esse espaço para discutir questões como representatividade e exibe filmes com temática LGBT. O Cine Arte UFF participa da programação, com destaque para a Competição de Curtas, que começa na quinta-feira (7), às 19h, além do Panorama Nacional média-metragem, Panorama Internacional e uma noite de curtas de horror. Mostrando que não existem limites de representatividade e nem barreiras de gêneros cinematográficos, o catálogo é recheado de obras de terror, suspense, romance, comédia, que vão ser exibidos durante os 10 dias de festival.

Criado em  2011, o “Rio Festival Gay de Cinema” mudou seu nome este ano para abarcar outras questões de gênero e sexualidade. No ano de 2015, Alexander Mello, diretor e criador do festival, criou categoria “Transcinema”,  um novo passo para quebrar o tabu em relação à discussão de gênero e sexualidade na sétima arte. 

“O festival sempre tenta se atualizar e se conectar com a realidade atual das questões LGBT. O nome faz diferença, já que antes muitos se sentiam excluídos pelo uso apenas do ‘Rio Festival Gay de Cinema’. Neste ano, estou muito orgulhoso da curadoria, porque a programação está abrangendo os principais debates do movimento”, acredita. 

Dessa vez, o festival tem a seção “Cinema explícito”, comentada por Rodrigo Gerace, que exibe experimentações transgressoras de sexo e homossexualidade, e uma mostra especial para curtas sombrios. Na seção “Sombrios”, que acontece no domingo (10), às 21h10, no Cine Arte UFF, o festival explora a quebra de padrões em relação à temática LGBT, em gêneros como suspense e terror. Serão nove curtas exibidos, sendo dois nacionais: “Canto da Sombra” e “Tutu da Lata”. No primeiro, dirigido por Thiago Kistenmacker, a cantora Jacque está disposta a entregar tudo o que tem para conquistar seus objetivos; já o segundo, se passa em um universo paralelo onde comercializar feijão é proibido, e a drag queen Dandy é viciada no grão proibido.

“Minhas principais referências queer (palavra que define quem não é heterossexual) cinematográficas são John Waters, Divine e Pedro Almodóvar. John Waters criou junto com a Divine uma realidade paralela completamente trash, que coloca drag queens e toda podridão humana como personagens principais em suas obras, o que eu acho completamente genial. Além de personagens bem trabalhados e instigantes, as cores muito vivas de Almodóvar são magníficas”, comenta o diretor de “Tutu da lata”, Vini Fernandes.

A Competição de Curtas vai até o dia 13, e exibe filmes nacionais e internacionais. Os jurados Antônio Moreno, Marcelo Müller, Quiá Rodrigues, e Rodrigo Gerace fazem parte da bancada responsável por julgar as obras. A premiação acontece no dia 15.

Além dos filmes, o Cine Arte UFF também vai promover duas sessões com convidados especiais: dia 11, com o documentário “Vozeria”, apresentado pelo ativista João W. Néry; e, dia 13, o diretor espanhol Gabriel Olivares participa de um debate sobre o seu longa “El Debut”. No filme, um grupo de atores interpreta uma peça sobre um toureiro homossexual que tem uma paixão platônica.  

“Nunca pensei em ‘El Debut’ como um ‘filme gay’, mesmo que os protagonistas sejam homossexuais. A sexualidade é natural da vida e do ser humano. Tento romper com as etiquetas porque acho que às vezes ela atrapalha nosso verdadeiro objetivo, que é a alma humana”, pondera Olivares. 

Após a exibição dos filmes, o público vai poder discutir com os convidados. No Rio de Janeiro, o festival exibe todas as mostras: “Transcinema”, “Diva”, “Mostra Nacional de Longa-Metragem”, e também as que ficam em cartaz em Niterói. Ao todo são 150 filmes no catálogo.

Além do arco-íris – Marcada por estereótipos e personagens coadjuvantes, a história dos personagens LGBT no cinema, como na sociedade, é permeada de censura e preconceito. Recentemente essas narrativas ganharam o mainstream em filmes como “A Garota Dinamarquesa”, “Carol”, “Direito de amar” e o nacional “Hoje eu quero voltar sozinho”. Atingir o circuito comercial, entretanto, gerou outros questionamentos, como: que representatividade ocupava esses lugares?

“Acho que, mesmo tendo melhorado, a representatividade LGBT no audiovisual ainda é bastante falha. Os conteúdos audiovisuais, que apresentam a figura do LGBT e têm maior repercussão midiática, tendem a ser mais estereotipados, fazendo com que a imagem do LGBT produzida pela mídia ainda seja motivo de muita chacota.”, afirma Vini Fernandes.

De acordo com Alexander, ainda existem preconceitos a ser quebrados pelo mainstream, porém o diretor e curador do festival afirma que entrar no circuito comercial é importante para atingir um público maior.

“Essa visibilidade LGBT tem aumentado e, diferentemente do que se pensa, existe muito público para esses filmes. É um assunto que sempre tem que estar em pauta e atingir mais e mais pessoas. Devemos quebrar e discutir sobre esse circuito comercial prioritariamente branco a todo momento e também ocupar os espaços dos cinemas”, pontua Alexander.

Caminhando lado a lado com a luta pelos direitos humanos, o cinema LGBT tem se consolidado como uma temática emergente na indústria cinematográfica. A importância de se debater gênero e sexualidade nos filmes é essencial para perpetuar o respeito e a aceitação. Assim como o uso das cores no cinema Technicolor, a representatividade transborda o arco-íris e alcança o mundo na luta pela igualdade. 

O Cine Arte UFF fica na Rua Miguel de Frias, 9, Icaraí, em Niterói. Quarta-feira (6), às 19h. Até 17 de julho. Preço: R$ 8 (inteira). A censura varia de acordo com o filme. Telefone: 3674-7515. Confira a programação no site:
riofgc.com.

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