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Serão expostas 14 carrancas raríssimas de Francisco Biquiba Dy Lafuente Guarany, além da Mãe D’água de Zézinho de Arapiraca, o Minhocão de Willy de Carvalho e o Caboclo D’água de Mestre Bitinho. Essa é a quinta exposição no espaço com curadoria de Jorge Mendes, sob gestão de Daniela Magalhães Moraschini
Lucas Benevides
Patrimônio natural que representa grande parcela de nossa riqueza hidrográfica, o famoso Rio São Francisco foi escolhido como tema da exposição “Valei-me!”, quinta montagem no Museu Janete Costa de Arte Popular com curadoria assinada pelo cenógrafo Jorge Mendes, que será aberta ao público dia 20, a partir das 10h. O rio, suas fases e seus mitos são fontes de inspiração para o imaginário popular brasileiro, para obras artísticas e incessantes pesquisas que buscam investigar as inúmeras facetas do Velho Chico.
A exposição foi dividida em quatro setores, com abordagem de vários temas ligados ao rio, como a importância dos recursos naturais para a sociedade ribeirinha, seu folclore, sua cultura, fazendo sempre analogias com temas atuais – uma preocupação do curador da mostra.
“Quando nós falamos do Rio São Francisco, estamos fazendo uma analogia com o Brasil de alguma forma. A gente elegeu um rio que é tido como de unidade nacional, genuinamente brasileiro, que nasce e morre aqui no próprio território. E, ao falar de um rio que une culturas, aproxima pessoas, que é generoso com seu povo, fazemos um paralelo com o País, que está dilacerado de alguma forma, polarizado.
O nome ‘Valei-me’ é inspirado em um pedido de proteção ao rio, e a exposição trabalha, basicamente, os temas ‘medo e proteção’, que também refere-se ao momento atual. ‘Por que eu tenho que ter medo de quem me protege?’, isto é, as diversas relações de poder em que se sente medo das pessoas que estão ali para proteger e não para amedrontar. Essa relação é muito atual”, explica Jorge Mendes.
No primeiro setor da exposição, os visitantes poderão contemplar carrancas não navegáveis dos anos 60 e 70, que são réplicas das tradicionais figuras icônicas carregadas de misticismo, que adornavam os barcos dos navegantes do Rio São Francisco. As peças foram cedidas pela professora Maria Vittoria de Carvalho Pardal, filha de Paulo Pardal, o maior pesquisador de carrancas do Brasil – que também será homenageado na exposição.
“Serão expostas 14 carrancas raríssimas do Francisco Biquiba Dy Lafuente Guarany, o ‘carranqueiro’ que mais fez carrancas navegáveis. O museu também terá o papel de mostrar que o fenômeno de carrancas acabou nos anos 50. Tudo que foi feito após a morte do artesão Guarany foi com o objetivo comercial, não estavam imbuídas de nenhum sentimento de proteção. O fenômeno de carrancas durou só 60 anos, foi de 1890 a 1950. Depois que entrou o vapor e as pontes, acabaram as carrancas com seu sentido místico”, lembra.
Jorge comenta que as carrancas foram escolhidas para fazer parte da mostra porque são objetos de proteção, dos perigos do rio, dos perigos de uma série de coisas; e, por outro lado, também dão medo nas pessoas. Apesar das ilustres carrancas, expostas pela primeira vez em Niterói, o curador enfatiza que o foco da exposição não são elas, mas, sim, o Rio São Francisco como um todo, com seus diversos nomes – como Copará, que era como os índios denominavam o rio; Velho Chico, como os sertanejos o chamam; e São Francisco, acompanhado de seus mitos – como a Mãe D’água, uma sereia em que os ribeirinhos acreditam; o Minhocão, uma grande serpente que desbarranca as margens do rio e afunda as casas; e o Caboclo D’água.
“A exposição inteira é feita com material reciclado ou reutilizado. A gente vai trabalhar a questão da preservação do meio ambiente e do rio poluído, uma grande referência à represa de Sobradinho. Essas referências invertem a situação comum. Normalmente, a representação é sempre do homem com medo do rio, a gente vai mostrar também o rio com medo do homem. Para isso, nós preparamos um redemoinho cenográfico em que as pessoas vão poder entrar, todo feito com sucata e lixo – enfatizando a questão dos danos ao meio ambiente. Então, a exposição tem vários significados”, adianta.
No segundo andar, ao lado da mostra permanente “Nosso trajeto, nossos caminhos”, foi preparado um espaço educativo igualmente proporcional ao da exposição do primeiro andar. Sob a supervisão de Maria Vittoria Pardal, os monitores – que são estudantes universitários de várias áreas – guiarão os visitantes pelo que a organização chama de “estações”, instalações interativas e oficinas didáticas, que têm o intuito de despertar diferentes sensações e reflexões, como o dilema entre o “ser” e o “estar”, o enfrentamento com os medos e a busca por equilíbrio e por um “Norte”.
“O que eu quero deixar de legado para minha gestão é justamente fortalecer a relação do educativo do museu com a cidade e com as escolas. Acho que esse é o grande potencial do nosso trabalho. Essa é a quinta montagem que fazemos com a curadoria do Jorge Mendes e uma particularidade da nossa equipe é que não trabalhamos sob a ótica de nenhuma obra, sempre buscamos o transbordamento através do educativo”, esclarece Daniela Magalhães, diretora do museu.
O Museu Janete Costa de Arte Popular fica na Rua Presidente Domiciano, 178, no Ingá. De 20 de setembro a 3 de fevereiro, de terça a domingo, das 10h às 18h. Entrada franca. Classificação: livre. Telefone: 2705-3929.
Fluindo proteção e medo
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