Trajetória no choro eternizada

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A dupla de choro mais antiga do Brasil será homenageada pelo historiador André Diniz e o pesquisador Diogo Cunha

Foto: Divulgação

Originado no Rio de Janeiro em meados do século XIX, o choro é considerado a primeira música urbana tipicamente brasileira. Herdeiro de toda a tradição musical deixada por Joaquim Antônio da Silva Calado – considerado o pai do choro–, pelos pianistas Ernesto Nazaré e Chiquinha Gonzaga, e pelo maestro Anacleto de Medeiros, Pixinguinha consolidou o choro como gênero musical. De lá para cá, o gênero ganhou diversos artistas consagrados. Um exemplo disso é a dupla Zé da Velha e Silvério Pontes, que esse ano completa 30 anos de carreira.

Em homenagem à dupla de choro mais antiga do Brasil, o historiador André Diniz e o pesquisador Diogo Cunha lançam o livro “A Menor Big Band do Mundo” em que  falam sobre a carreira dos músicos. O lançamento será hoje no Al-Farabi, uma mistura de sebo e restaurante no Centro do Rio. A partir das 14h, o evento aberto ao público contará com uma roda de samba e choro gratuita, comandada pelo cantor e compositor Chico Alves. 

Além dos autores, Silvério e Zé comparecerão no local para conversar com o público e autografar os livros, vendidos pelo preço de 35 reais. Niterói também receberá um evento de lançamento do livro no Bar Itália, em Charitas, no próximo dia 18, a partir das 14h.

Natural de Sergipe, José Alberto Rodrigues Matos, o Zé da Velha se mudou para o Rio aos 15 anos, quando iniciou no trombone. Logo após, se enturmou com músicos de gafieira, sambistas e chorões da Velha Guarda, de onde veio o apelido que virou nome artístico. Já o trompetista Silvério Pontes, 20 anos mais jovem que Zé, transita pela área do choro e tocou ao lado de artistas como Tim Maia, Elza Soares, Luiz Melodia e integra o naipe de metais do grupo de reggae Cidade Negra. A parceria, que aconteceu de forma natural, começou em 1986 e deu tão certo que os dois passaram a se apresentar juntos.

Esse é o quinto livro escrito em conjunto por André e Diogo. Presidente da Fundação de Arte de Niterói (FAN), André já é experiente no assunto abordado. Além de conhecer a dupla de instrumentistas desde sua juventude, o autor tem diversas pesquisas sobre o choro, livro publicado sobre a história do ritmo e sobre os músicos Calado e Anacleto.

“Essa foi uma oportunidade de fazer uma homenagem há esses 30 anos de carreira. Não há na história da música instrumental uma dupla com tanto tempo juntos e que acumula tanto carinho e reconhecimento da sociedade. Eles tocam dois instrumentos difíceis no choro, que é o trombone e o trompete. Juntando tudo isso, eu e Diogo resolvemos homenageá-los com o livro”, relata André.

Para narrar a história foi preciso muitas entrevistas, tanto com a dupla e com amigos e parceiros de música como Yamandu Costa e Beth Carvalho, assim como consultas a jornais e revistas que retratam a trajetória deles.

“Por ser nosso quinto livro juntos, já possuímos uma grande sintonia, então cada um escreve um capítulo e manda para o outro para revisão. Acredito que esse livro será um sucesso, pois muita gente já nos pediu para reservá-lo e para levá-lo a outros estados. O nosso intuito é homenageá-los por serem geniais e, também, para deixar como memória na história dos instrumentais”, comenta o historiador.

André e Diogo mantém sua parceria desde o início dos anos 2000, quando Diogo era pesquisador dos livros de André. Eles souberam dos 30 anos da dupla após os entrevistarem, no ano passado, para o projeto Estações Musicais da Leopoldina do Observatório de Favelas, uma organização dedicada à produção do conhecimento e de proposições políticas sobre as favelas e fenômenos urbanos.

“Somos ‘fãs de carteirinha’ dos dois, a meu ver, eles são o Pelé e Garrincha da música instrumental brasileira. Quando Silvério nos contou da data especial tivemos o pontapé para escrever esse perfil biográfico”, conta.

Zé da Velha e Silvério Pontes receberam a notícia do livro com muita alegria e graditão. Com mais anos de experiência, Zé carrega um grande legado musical, tendo tocado com diversos outros chorões, inclusive Pixinguinha.

“É uma homenagem bacana à nossa vida. Esse trabalho também recupera algumas fotos antigas nossas que guardamos ao longo desses 30 anos e algumas de outras experiência de Zé. Todo esse tempo foi um aprendizado e fazemos com muito carinho e amor aos nossos ouvintes. O interessante é deixar para a nova geração que está tocando como é importante ser humilde e  aprender uns com os outros. O livro mostra muito esse nosso lado simples”, comenta Silvério. Ele acredita que o livro está gostoso de se ler, pois há a parte técnica e a história musical de cada um e da dupla. 

“A música brasileira não tem muito espaço nas produções, na televisão e na rádio, e ganharmos uma biografia é marcante, pois vai eternizar a nossa história”, finaliza Silvério. 

Histórias - O disco está recheado de histórias curiosas e inusitadas da vida e carreira de Silvério Pontes e Zé da Velha. Duas delas foram lembradas pelos escritores como sendo marcantes. Em 1994, o Silvério Pontes foi convidado para participar do programa Hoje é Dia de Choro, na TV Manchete junto com o Zé da Velha. Na época, Silvério tocava na banda do Tim Maia, a Vitória Régia. Devido ao programa Silvério se atrasou para o ensaio da banda, e quando chegou foi informado que o “Síndico”, como Tim era chamado, queria uma “reunião de condomínio” com urgência. Silvério foi até o quarto onde estava o cantor e viu aquela “cena de terror”: Tim de cueca, uma samba-canção, assistindo no videocassete à apresentação de Zé e Silvério.

Tim solta a pérola:

— Ô, Silvério, que história é essa de você gravar com esse tal de Zé Bodega? Ou você toca com a Vitória Régia ou com esse trombonista aí...
Silvério rebateu:

— Não é Zé Bodega, é Zé da Velha!

Apesar da bronca, Tim Maia curtiu muito o som que Silvério produziu com o “Zé Bodega”.

Outra das histórias foi a vez em que a ‘menor big band do mundo’ foi a Minas Gerais tocar em uma cidade. No camarim, um repórter de uma rádio local perguntou para eles:
- O que vocês vão cantar hoje como dupla sertaneja?

Com bom humor, eles explicaram que tocavam apenas instrumentos. E o outro respondeu:

- Eu nunca vi uma dupla de instrumentos.

O Al-Farabi fica na Rua do Rosário, 30, no Centro do Rio. Hoje, a partir das 14h. Entrada franca. Livro: R$ 35. Censura: livre. Telefone: 2233-0879.