Com mais de 30 anos de pesquisa sobre arranjos conjugais no Brasil, a antropóloga Mirian Goldenberg apresenta seu novo livro que expõe o resultado de entrevistas com mais de 50 casais em que os homens eram mais novos que as mulheres. A conclusão da pesquisa busca apontamentos para a resposta homônima do título da obra: Por que os homens preferem as mulheres mais maduras?
Por que os homens gostam de mulheres mais velhas?
A ênfase dos maridos está colocada na superioridade de suas esposas com relação às mulheres mais jovens. Para eles, as esposas são mais compreensivas, mais interessantes, mais carinhosas, mais generosas e mais alegres do que as mulheres mais jovens. São também mais animadas, mais positivas e mais jovens de comportamento do que eles próprios. Eles destacam o cuidado como a principal característica de suas esposas. Elas seriam extremamente disponíveis, atenciosas e generosas não só com eles, mas também com os filhos, netos, pais, familiares, amigos. Para os pesquisados, as esposas são superiores às mulheres mais jovens pela capacidade que têm de cuidar deles, traduzida em palavras como: compreensão, amizade, parceria, companheirismo, cumplicidade, carinho, atenção, apoio, escuta, porto seguro, paz, colo, experiência e maturidade. Todos os pesquisados dizem que são, na realidade, mais velhos que as esposas. Elas são “jovens de espírito”: são joviais, extrovertidas, animadas, divertidas, alegres, engraçadas, brincalhonas, otimistas, positivas, cheias de energia, gostam de sair, dançar, passear, enquanto eles preferem ficar em casa vendo televisão. Elas são detentoras dos principais capitais da relação. Elas são superiores justamente por serem mais velhas, experientes e maduras. Para eles, a juventude feminina não é um valor, mas uma ausência de valor. A juventude significa cobranças, inseguranças, imaturidades, faltas e infantilidades. A mulher mais velha pode dar muito mais para eles do que uma mais jovem.
Quais as dificuldades e facilidades apontadas por elas nessas relações?
As pesquisadas falaram muito mais de si mesmas do que dos maridos, ao contrário deles, que passaram a maior parte do tempo falando dos atributos positivos delas. É também curioso observar que os principais capitais para os homens são características relativas ao que “elas são”, enquanto o discurso feminino é voltado para o “ele me faz sentir”. Elas são muito autoelogiosas, parecendo querer justificar o interesse deles por elas, como se fosse necessário compensar a falta de juventude com um excesso de outras qualidades. Os elogios que fazem a si mesmas parecem funcionar como um mecanismo de compensação: o fato de serem mais velhas e, consequentemente, possuírem inúmeras qualidades que as mulheres mais jovens não têm, faz delas mulheres “superiores”. Neste sentido, poderíamos dizer que elas transformam a falta de juventude em virtude. Ou ainda, elas manipulam o possível estigma para produzir uma situação de superioridade. O marido é um verdadeiro capital em um mercado matrimonial em que os homens disponíveis são escassos. Assim, para elas, a principal qualidade masculina seria a de enxergar que elas são superiores às mulheres mais jovens. As pesquisadas fazem questão de afirmar que eles é que são mais velhos do que elas, que eles têm “cabeça de velho”, que se comportam como velhos. Elas seriam mais jovens do que eles, em termos de comportamento, personalidade e espírito. Todas as pesquisadas afirmaram que o relacionamento começou como uma brincadeira sem expectativas de compromisso. Elas não pensavam no futuro e acreditavam que o relacionamento não iria durar muito. Só queriam se divertir e aproveitar o momento. Em função da diferença de idade, elas achavam que a relação iria terminar rapidamente e que logo eles encontrariam uma namorada mais jovem. Pode-se pensar que o próprio fato de a relação ser encarada por elas como uma brincadeira acabou fortalecendo o amor e a admiração que eles sentem por elas. O fato de já terem sido casadas (todas com homens bem mais velhos) também é uma referência para elas. Elas sabem que o fim de um casamento e de um amor não tem a ver com a idade, e sim com o que fazemos no nosso dia a dia. Acho que o segredo dos casais que pesquisei é exatamente este: eles cuidam, são atenciosos e carinhosos todos os dias, valorizam o parceiro e sentem que são únicos e especiais.
Como os homens entrevistados analisam a relação com uma mulher mais velha?
Os casais estudados, ao inverterem a lógica da dominação masculina, que exige que os homens sejam superiores às mulheres em idade e em outros atributos (altura, poder, prestígio, dinheiro), parecem encontrar uma lógica compensatória. As mulheres têm mais idade, mas são consideradas menos chatas, menos infantis, menos ciumentas, menos controladoras, menos inseguras. Os homens têm menos idade, mas são mais atenciosos, mais românticos, mais carinhosos, mais presentes, mais fiéis. Por mais estranho que possa parecer, apesar de este tipo de relação ser considerada desigual, encontrei uma situação bastante equilibrada para os homens e mulheres pesquisados. Aparentemente, elas são percebidas como dando muito mais do que eles, em termos de posição social, maturidade, experiência, cuidado, carinho e atenção. No entanto, eles dão aquilo que elas mais desejam: a sensação de serem superiores, únicas e especiais.
Eles usam recorrentemente a ideia de “salvação” para justificar o amor que sentem por elas. Especialmente no início da relação, eles dizem que elas “salvaram” suas vidas, no sentido de guiá-los para um caminho melhor, de cuidar deles, de ajudá-los a se afastar das drogas, da bebida e das más companhias. Muitos disseram que, antes delas, “estavam perdidos no mundo”. Por outro lado, a mesma ideia de “salvação” pode ser aplicada a elas: eles as salvaram da invisibilidade em um mercado matrimonial que valoriza a juventude feminina.
O atual presidente francês, Emmanuel Macron, de 39 anos, é casado com Brigitte, de 63. O que representa esta união?
O caso do Macron e Brigitte é maravilhoso justamente porque mostra que não é considerado “natural” nem comum um homem amar e casar com uma mulher muito mais velha. Como mostro no livro, se a diferença fosse menor, seria mais aceitável. Mas como ele tem a idade dos filhos dela, o caso se torna inaceitável para grande parte das pessoas, especialmente para as mulheres. Discuto no livro o tabu da idade associado ao tabu do incesto. As pesquisadas falam, com vergonha e culpa: “ele tem idade para ser meu filho”, “ele poderia ser meu filho”. Elas sentem muita vergonha e sofrimento com o olhar acusador dos outros, sobretudo das outras mulheres. Eles nunca falam o mesmo e reagem quando são chamados de filhos. Dão beijo na boca delas quando percebem o olhar preconceituoso. O fato de mulheres famosas assumirem, cada vez mais, suas escolhas por homens mais jovens reforça a ideia de que é possível amar fora dos padrões. No entanto, o fato de poucos homens famosos escolherem mulheres mais velhas mostra que essa escolha não é tão legítima assim. Parece que só mulheres muito poderosas podem ser livres para escolher homens mais jovens. Precisamos de mais Macrons!
De que forma a família tem se comportado diante de casos como este?
Quando a diferença de idade é maior, os preconceitos e estigmas são maiores. Eles precisam enfrentar as acusações e preconceitos dentro da própria família. Nos casos que pesquisei, estas dificuldades acabam fortalecendo o amor, o respeito e a admiração. A segurança se torna cada vez maior, porque eles precisam estar muito unidos e certos do que realmente querem. É preciso ter muita coragem para enfrentar os próprios preconceitos, medos e inseguranças.
A sociedade já absorveu com naturalidade este tipo de relação ou ainda é um tabu?
A realidade do mercado matrimonial está mudando. O IBGE mostra que cresceram as uniões em que as mulheres têm idade superior à do homem. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, de 1996 a 2006, essas uniões passaram de 5,6 milhões para 7,6 milhões, um crescimento de 36%. De acordo com a PNAD, dos 7,6 milhões de casais nessa situação, 64,7% são formados por cônjuges que têm de 1 a 4 anos de diferença, 23,2% de 5 a 9 anos e 7,7% de 10 a 14 anos de diferença. No período analisado, o número de famílias em que a mulher vive com um homem mais jovem aumentou 59,5%: de 585 mil para 927 mil. No entanto, as mulheres ainda têm muita insegurança. Elas sofrem muito, principalmente no início. Acham que é algo provisório, que serão trocadas por mulheres mais jovens. Elas têm pânico de envelhecer. Só com o tempo e com a certeza de que o amor deles é realmente especial, conseguem ter um pouco mais de segurança. Em um mercado matrimonial desvantajoso para as mulheres. Ter um marido apaixonado e fiel é motivo de satisfação. O marido, neste caso, é um capital ainda mais valorizado por escolher uma mulher mais velha, quando teria muitas possibilidades de escolher esposas mais jovens.