O corpo foi feito para se movimentar. Após o exercício físico, nosso cérebro libera substâncias que causam uma sensação de satisfação e bem-estar. Adicionando uma boa música, que também pode variar nosso humor, a dança é ideal para levantar o moral e manter o corpo ativo, principalmente para quem já não tem mais toda aquela energia. Afinal, o velho ditado faz sentido: quem canta e dança, seus males espanta.
Não é à toa que a Domingueira Dançante do Clube Canto do Rio, voltado para o público sênior, atrai cerca de 300 pessoas todo domingo à noite. As músicas são por conta de convidados, ou de seresteiros, que costumam também frequentar o local, como Núbia, 80 anos, e Izidoro, 86, juntos há 42 anos.
Os dois se conheceram em outra seresta, que ainda existia no ano de 1974, na Quadra do Luzitano, na Ilha da Conceição. Núbia havia voltado a cantar naquele mesmo ano e se apresentava no baile do Canto do Rio. Antes, chegou a ganhar um programa de calouros na Rádio Tupi, mas o então marido não a deixou continuar a carreira de cantora. Após se tornar viúva, decidiu voltar a perseguir o sonho de cantar nas serestas que frequentava, em homenagem ao irmão, que a estimulava no canto.
“Meu irmão sempre gostou muito de me ouvir cantar, e eu cantava muito em casa. Quando eu estava noiva, ele me levou num programa de calouros, e eu ganhei. Mas meu falecido marido me mandou escolher entre ele e o canto, e eu era muito apaixonada, então decidi por ele. Depois que nos separamos, eu resolvi voltar a cantar e continuo até hoje”, lembra Núbia.
Foi escutando Núbia cantar que Isidoro se interessou. Ele começou a comprar refrigerantes para ela, através de sua cunhada, que era garçonete no clube. A moça dizia apenas que eram de um fã, até que Isidoro resolveu se revelar, após três meses a cortejando. O primeiro contato de verdade foi quando Núbia se aproximou dele para entregar convites de uma festa promovida por um amigo.
“Quando ela colocou a mão no meu ombro, senti um arrepio nas costas. Ela canta muito, tem uma voz linda. Perguntei se ela iria à festa também. Ela disse que sim, então eu falei que iria, para conversarmos”, recorda, Isidoro, apaixonado.
Os bailes sempre fizeram parte da vida do casal. Núbia vem cantando em serestas desde o início do namoro, como na seresta do Espaço Gaúcho, às quintas-feiras, na Rua Oscar Fonseca, e o baile conhecido como “Fonsequinha”, na Rua Felício Toledo.
Se engana quem pensa que esses bailes não são animados. As festas e a pista de dança estão sempre cheias, até de quem vai sem par.
Na Domingueira Dançante do Canto do Rio há um projeto chamado “Cassino Dançante”, onde damas podem comprar uma ficha, por R$ 4, para dançarem com um dançarino profissional da casa. A coordenadora do projeto, Vânia Cortes, conta com 20 dançarinos, sendo três professores de dança.
Vânia diz que as frequentadoras do baile adoram o Cassino Dançante. Algumas chegam a ligar para ela, querendo confirmar se os dançarinos estarão lá. A coordenadora explica que o Cassino facilita o lazer de senhoras que não podem contratar um dançarino fixo para comparecer com elas a festas e comemorações.
Além da vantagem financeira, há também a importância para a saúde. Antes do Cassino, senhoras divorciadas ou viúvas, que não tinham par, se arrumavam para o baile e passavam a noite inteira sentadas. Agora, elas passam a noite dançando e interagindo, trazendo benefícios psicológicos e físicos, mantendo o corpo em movimento.
“Às vezes eu penso em parar, mas não tenho coragem. É um projeto social que eu faço, com elas e com os dançarinos. Eu não ganho um tostão, todo o dinheiro fica com os meninos. Tem dançarinos que dependem disso para pagar a faculdade”, revela.
A Domingueira Dançante acontece no Canto do Rio desde os anos 1970. O atual organizador, Célio Farias, vice-presidente social do clube, foi chamado com o desafio de revitalizar a área social do baile. Na época, o baile atraía, em dias movimentados, 50 participantes, no salão que comporta 400 pessoas.
“A estratégia foi diminuir o conservadorismo do baile. Flexibilizaram-se as regras de vestimenta, permitiu-se que dançarinos tirem as damas para dançar, de onde surgiu o Cassino Dançante, e procurou-se trazer atrações para estimular o público a voltar ao programa, a um preço bem mais barato”, explica Célio.
Hoje, Célio se orgulha do sucesso do baile. Um ambiente que estimula pessoas a curtirem sua melhor idade, saindo de casa, se divertindo e se movimentando.
Os bons tempos podem ser agora, para qualquer idade.