Ao grande amor que ficou

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Rio de Janeiro, 25 de junho de 2017

Ao grande amor que ficou,

“se o mundo for desabar sobre a sua cama
e o medo se aconchegar sob o seu lençol
e se você sem dormir, tremer ao nascer do sol
escute a voz de quem ama, ela chega aí”
Sou seu sabiá – Caetano Veloso

Eu ainda concordo com a máxima de que todas as cartas de amor são ridículas. Mas eu sigo escrevendo mesmo assim. Poderia ser uma correspondência só para saber como estão as coisas ou então para dizer como os tempos atuais massacram a gente de insegurança sobre a própria existência. Mas não é isso. Queria fazer dessa carta – veja se me entende – uma espécie de manifesto sobre o meu amor por você. Acordei com uma vontade imensa de dizer que eu ainda conto as horas quando você está para chegar. E, quando você não está, meu corpo fica em estado de alerta. É como se a qualquer momento você pudesse aparecer e sorrir para mim. Sorrir sem ser custoso, sabe? Sorrir pra desanuviar. Sorrir para que eu consiga desfranzir o cenho e sorrir também. 

Eu vim para confessar meu interesse. Para dizer que você não precisa ter dúvida. Ainda que se acheguem outros amores mais ou menos obtusos, você vai ficar por aqui. Eu espero que esse pensamento lhe proporcione a tranquilidade que proporciona a mim. Além disso, espero também que você saiba o quanto me fez bem perder as rédeas que achei que tinha sobre a minha própria vida. Como é bom me lançar para além dessa linha que impuseram, desenharam. Eu perdi o medo de confessar a quem queira saber que – nos tempos atuais e sendo quem eu sou – é muito difícil ser só. Nós nos escolhemos como um dos instrumentos para aperfeiçoar a nossa estada aqui. Para evoluir. Aprender mais intimamente sobre limites, humanidade, doação, respeito, tolerância, felicidade. Está tudo bem, mesmo sem saber quanto tempo isso pode durar. 

Seria capaz de escrever sobre amor próprio, autocompaixão, autoestima. Mas eu escrevi para falar sobre como é bom poder contar com você. Às vezes pode parecer que, na euforia dos dias, eu queira só fazer as minhas vontades, da forma que eu considero mais justa. Mas não é bem isso. É só uma vontade imensa de te coparticipar de todas essas coisas. De desvendar para você um mundo que nunca tive vontade – ou melhor – oportunidade de fazer com ninguém. Me perdoe pelos excessos e pelas faltas durante essa trajetória. O fiz com as melhores das intenções. Isso não justifica tudo, mas explica boa parte das coisas. E, claro, para além de tudo isso eu quero que você esteja só onde precisa estar. 

Essa é minha tentativa de expor a minha vulnerabilidade, a ponto de não ser vulnerável a mais nada. É tornar tudo límpido a ponto de vermos só o reflexo do que somos. Eu com meus costumes, maneiras e afetos. Você com os seus. Sem que sejamos só uma projeção besta de desejos, egos, cobranças. Eu, que tenho quase tudo o que preciso ou pelo menos tenho aprendido a me concentrar no que é possível. Eu, que me entendo como uma mulher inteira, com angústias, alegrias e compaixão. Eu, que escrevo cartas de amor mesmo sabendo que são ridículas. Eu, que acredito na temporalidade das coisas, mas entendo cada pedacinho do que a gente tem como eternidade. Eu não tenho medo de dizer que estou aqui, que o teu afeto me afeta, que a tua presença me comove. Eu aprendo, diariamente, a olhar de novo pra vida. Aprendo a viver, conviver, viver junto. Obrigada pela oportunidade de ser eu, mesmo tendo a certeza de que há você. É raro.

um beijo com tudo de bom,
te amo sem medo. 

2017/inverno