O Brasil doce

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No mercado existem diferentes variedades de açúcar, como o branco refinado, cristal, mascavo, demerara, entre outros

Foto: Divulgação

As primeiras mudas de cana-de-açúcar chegaram ao território brasileiro por volta de 1530 para dar início à colonização do País. O produto é considerado uma das primeiras atividades econômicas do Brasil, já que grande parte da produção era voltada para a exportação. Hoje o açúcar está na mesa, no café e nos doces de boa parte dos brasileiros.

É o que mostra a pesquisa “Consumo equilibrado: uma nova percepção sobre o açúcar”, realizada na capital paulista pelo Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia para a “Campanha Doce Equilíbrio”. Divulgada no final de maio, a iniciativa tem o objetivo de compreender os hábitos e comportamentos de quem consome açúcar.

Foram realizadas 1.199 entrevistas com homens e mulheres de 18 a 85 anos – pacientes do ambulatório do hospital e pertencentes às classes A, B e C – durante os meses de setembro a dezembro de 2015.

De acordo com o coordenador do levantamento Daniel Magnoni, cardiologista e chefe de nutrição do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, a pesquisa pretende entender o universo de conhecimento e dúvidas dos pacientes, além dos mitos e das verdades relacionadas ao consumo e aos hábitos de vida dos brasileiros. 

“O brasileiro consome açúcar mais do que o recomendado, mas também faz pouca atividade física. O açúcar não é o vilão, o vilão é o abuso. Ele é necessário em torno de 5 a 10 %  das calorias totais”, explica Magnoni, que também aponta que é necessário uma educação nutricional para ensinar o público em todas as faixas etárias e em outros segmentos sociais, econômicos e  culturais a como utilizar o açúcar de forma balanceada. 

“De outro lado, também precisamos atentar para os outros vilões, como o consumo de gordura saturada, o sal e o sedentarismo”, analisa o cardiologista, que concorda com a ideia de que o consumo do açúcar em alimentos industrializados, e não apenas o adicionado no café, suco, chá e bolo, deve ser mais atentado.
“O consumo está exagerado. Reduzimos o consumo de açúcar adicionado e o ampliamos em alimentos industrializados”, revela.

No mercado existem diferentes variedades de açúcar, como o branco refinado, cristal, mascavo, demerara, entre outros. Na pesquisa, dos 71% que afirmaram consumir o ingrediente, 85% relataram utilizar o açúcar branco, 3% o açúcar mascavo, 1% o demerara. Para uma alimentação mais saudável e equilibrada, a nutricionista Samara Lopes, da Renewmed, afirma que o ideal mesmo é que as pessoas tentem não adoçar os alimentos, sentindo o real sabor deles. 

“Se for inevitável, prefira o açúcar de coco, que tem índice glicêmico mais baixo que os demais e, em seguida, o demerara, em que o refinamento é muito leve e não recebe aditivos químicos. Sempre lembrando que açúcar é açúcar e é sempre bom evitar”, adverte.

No estudo também foi apontado que 88% dos entrevistados disseram utilizar o açúcar para adoçar o café ou o chá, 62% em sobremesas e bolos, 7% o colocam no suco e 42% o adicionam no leite.

Os doces são tão presentes na vida de Chrystiano Porto, que ele se matriculou em um curso de confeitaria para aprender a fazer as delícias que come na rua em casa

Foto: Lucas Benevides

“A quantidade indicada é por volta de 25g de açúcar por dia, e isso engloba tudo que os envolva, como biscoitos, bebidas, doces”, aconselha a nutricionista Samara.
Os doces são tão presentes na vida do administrador Chrystiano Porto, de 28 anos, que ele se matriculou em um curso de confeitaria. Cansado de comer bolos de massa pronta, hoje ele prepara os seus próprios quitutes.

“Hoje em dia, acabo fazendo mais coisas para experimentar mesmo. Tenho vontade de, futuramente, vender as coisas. Por ora, estou vendo, mas não é aquela coisa”, adianta.
Com um consumo diário de doces, Chrystiano se considera um verdadeiro “viciado” em açúcar. Durante a semana, ele consome toda variedade de produtos açucarados, como bolo de chocolate, torta de limão, cookie, brownie, sorvete quando está calor, entre outras sobremesas. 

“Costumo comer muito biscoito, bala e refrigerante. Mas quando faço bolo ou algum doce, como mais. Está lá, eu não vou deixar de consumir. Além disso, também almoço e janto, mas, sempre nos intervalos, como muito doce”, conta Chrystiano, que também está na estatística daqueles que consomem açúcar de forma direta, ou seja, para adoçar os alimentos. “Café com açúcar, adoçante não. Vez ou outra, aquele açúcar fit, mas geralmente açúcar ‘normal’ (do tipo branco refinado). Coloco umas três colheres de sopa, não muito cheia, no café e no suco”, confidencia.

Os doces fazem parte do programa familiar da estudante de Antropologia Monique Floriano, de 20 anos. Todo domingo, ela e sua mãe, Claudia Floriano, se reúnem para preparar uma sobremesa juntas.

“Não é só da minha parte. A minha mãe, mesmo quando falo que vou dar um tempo nos doces, continua preparando. Por mais que passemos muito tempo juntas, a gente também faz como se fosse um programa semanal de mãe e filha”, relata Monique.

Os grupos “biscoitos e bolachas doces” (46%) e “doces e bolos caseiros” (45%) são os mais citados entre os entrevistados que consomem alimentos doces. Assim como os participantes do estudo, Monique também consome muitos produtos desses dois grupos, principalmente no café da tarde.

“Consumo muito biscoito recheado, doces como pavê, brownie, cheesecake, torta... Toda semana tem bolo em casa, às vezes, são dois por semana”, revela Monique, que também conta que já passou um dia inteiro só comendo esse tipo de alimento. “Posso falar para você com toda a certeza que eu posso passar o dia inteiro sem comer nada salgado. Salgado que eu digo comida ou salgado mesmo, tipo pão de queijo, empadão, qualquer coisa”, assegura.

Na pesquisa, os dados também mostram que 30% dos entrevistados praticam atividades físicas. Desse total, 67% ingerem açúcar e, dos que consomem, 73% mantêm o peso adequado. A endocrinologista Jaqueline Pais, do Hospital Icaraí, esclarece que o açúcar, associado à atividade física, melhora a tolerância à glicose e a sensibilidade à insulina tanto em indivíduos diabéticos, quanto em indivíduos saudáveis.

“Essa pesquisa mostra que os pacientes saudáveis, que fazem atividade física, controlaram o peso usando o açúcar. Ela mostrou, ainda, que faz parte da rotina do brasileiro o consumo do açúcar. O ideal é você ter um estilo de vida saudável, uma alimentação adequada e atividade física diária”, explica Jaqueline, que ainda afirma que o sobrepeso e a obesidade podem ocasionar problemas de saúde, como hipertensão, diabetes, doenças cardiovasculares. Além disso, essas doenças também estão associadas ao sedentarismo. 

“A Organização Mundial de Saúde orienta a atividade física por pelo menos 30 minutos em 5 dias da semana e um fortalecimento muscular duas vezes na semana. É uma orientação tanto para pessoas diabéticas quanto para as saudáveis”, esclarece.

Lorena Queiros se enquadra entre os entrevistados que associam o consumo de açúcar com a prática de atividade física regular.

Foto: Arquivo Pessoal

A estudante de estética Lorena Queiros, de 21 anos, se enquadra dentre os entrevistados que associam o consumo de açúcar com a prática de atividade física regular.
“Agora que voltei a jogar futebol estou mais equilibrada. Antes eu estava muito parada e comendo muita besteira, não só doces. Mas o doce não consigo abrir tanto a mão”, revela.

Normalmente, a estudante comia um brownie de avelã depois do almoço. No entanto, ela considera o seu consumo de doces um pouco elevado e está tentando diminuir a quantidade aos poucos. 

“Acho que quase todo dia eu como uma barra. Quando eu ganho uma barra, na mesma hora, como ela inteira. Porém, o brownie eu estou tentando evitar, porque estava comendo todo dia. Agora, chocolate, eu devo comer umas três vezes por semana”, admite. 

Dos 1199 entrevistados, 52,5% são mulheres e 47,5% homens. Dos que consomem açúcar, as mulheres também são maioria, ou seja, representam 53,5%. O levantamento revela que a oscilação hormonal durante a tensão pré-menstrual é determinante para a maior procura das mulheres pelo produto. Despontam como doces favoritos de 45% das entrevistadas bolos, doces caseiros, biscoitos e bolachas. Já o chocolate é a preferência de 37% delas. Segundo Magnoni, o açúcar funciona como um “controlador” das emoções.

“O açúcar está relacionado com as questões hormonais, pois, quando consumido com prazer, libera serotonina. Às vezes, as mulheres procuram prazer ou redução da ansiedade com o consumo de açúcar”, explica o coordenador da pesquisa.

Lorena também acompanha a estatística. Não só durante a TPM, como quando também apresenta sinais de dor de cabeça, ela recorre aos doces, mais especificamente ao chocolate.

“Para falar a verdade, eu nem compro remédio para dor de cabeça, eu compro chocolate e já como. E na TPM: fato. Sorvete, chocolate, consumo todo tipo de doce que possa ajudar”, conta.