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Em “Mas você vai sozinha?”, Gaía Passarelli relata situações marcantes de viagens feitas sozinha

Foto: Divulgação

No livro “Mas você vai sozinha?”, da Globo Livros, a escritora de viagem e jornalista musical Gaía Passarelli, de 39 anos, relata sua experiência de se aventurar, sem companhia, por diferentes lugares do mundo. Em um tom leve e bem-humorado, suas crônicas também relatam episódios inusitados, como o de ser consolada por um xamã andino, molhar os pés nas águas do mar em uma praia da Índia, participar de um ritual indígena na Colômbia e dormir debaixo de uma mesa de bar no Texas.

A autora também incentiva o leitor, especialmente a leitora, a tomar a decisão de conhecer algum lugar por conta própria, sem se importar com os preconceitos. Para a escritora, a decisão de viajar sozinha – o que, em inglês, já tem até um nome, solo travel – pode ser muito recompensadora.

Viajar sozinha tem um sabor especial?

Ah, tem sim. Pra quem gosta de fazer as coisas sozinha (meu caso, e de muitas outras viajantes também) é hora de aproveitar o momento. Para quem não tem esse hábito é uma chance de aprender sobre si mesma e, quem sabe, abandonar a ideia de que só é possível curtir uma viagem com companhia.
 
Quais as principais dificuldades para se viajar sozinho, especialmente para as mulheres?

Só posso falar enquanto mulher. Acho que é passar por cima da ideia de que os outros estão reparando em você, sabe? Parar de se preocupar com coisas como: “Ai, mas o que vão pensar se eu for jantar sozinha num restaurante?”. Tirando essa segurança interior, existe uma coisa de segurança real também, é fato. Uma mulher sozinha é vista como alguém procurando companhia e pode ser alvo de golpes e truques. Tem que ficar esperta, se informar sobre onde vai, saber de antemão como funciona a cidade que vai visitar. Quanto mais informada, mais segura. Mas não é pra ficar achando que o perigo está em toda parte também. Uma das coisas mais legais de viajar é estar aberta a conhecer lugares e pessoas.

Depender de companhia para viajar pode atrapalhar a vida?

Depende. Se você quer viajar e não viaja por achar que companhia é essencial, então a falta de companhia atrapalha. Mas conheço mulheres que simplesmente não curtem viajar solo por qualquer motivo, e tudo bem. Não gosto de dizer que toda mulher  “precisa” viajar sozinha. Claro que é uma experiência incrível e que eu recomendo. Mas a real é que você deve viajar como se sentir mais confortável.

A jornalista relata ainda como foi ser consolada por um xamã andino e participar de um ritual indígena na Colômbia

Foto: Divulgação

Que experiência você considera mais marcante, ocorrida em suas viagens sozinha, que não seriam possíveis se estivesse acompanhada?

Não sei qual é a mais marcante, mas posso contar da minha viagem mais recente. No primeiro semestre desse ano, passei duas semanas na Patagônia sem plano definido, pegando carona (que é uma prática muito segura na região) e inventando meu próprio roteiro durante a viagem. Fiz coisas incríveis como chegar na vila mais ao sul do continente, viajar de navio cargueiro com as famílias dos marinheiros e caminhar até uma geleira. Claro que eu poderia fazer essas coisas junto com alguém, não é uma exclusividade de estar só, mas sozinha eu pude fazer o que tinha vontade no momento sem me preocupar se a outra pessoa aprova ou quer. 
 
Para quem pensa em adotar esse estilo de viagem, que conselhos você dá?

Se informar, pesquisar sobre o destino. Fazer seguro-viagem é obrigatório e manter alguém de casa informado sobre onde você vai e onde estará é sempre bom. Fora isso, aprenda a ouvir e respeitar seus próprios instintos. Se uma situação está te deixando desconfortável por algum motivo, preste atenção. E aprenda a contar com os outros também. Todas as vezes em que eu pedi ou precisei de ajuda durante uma viagem, recebi ajuda de alguém, mulheres e homens.
 
O que essa autonomia trouxe para a vida?

Viajar sozinha trouxe exatamente isso: autonomia. Mas eu sempre gostei de fazer coisas sozinha, desde criança, então talvez seja mais certo dizer que viajar sozinha trouxe uma percepção dessa autonomia. Uma das coisas mais legais de viajar solo é perceber o quanto você é capaz de fazer as coisas – de arrumar a mala a organizar roteiros de trem, de decidir em que bairro ficar, a cozinhar a própria comida com ingredientes estranhos na cozinha de um apartamento alugado.
 
Você acha que as culturas em geral acolhem pessoas adeptas da solitude?

Sim. Pessoalmente, apesar de já ter sentido insegurança, nunca me aconteceu de chegar em um lugar e me sentir malrecebida por ser mulher sozinha. Sei de experiências de outras pessoas que já passaram perrengues, alguns bem sérios, mas, no geral, acredito que as pessoas veem com bons olhos e acolhem os viajantes, solo ou não.
 
Independente da forma, você também é um adepta da máxima “viajar é preciso!”? Por quê?

Muito. Porque viajar nos permite aprender sobre o mundo em que vivemos e nos relacionar com outras pessoas, ideias e culturas. Claro que dá pra viajar e não aprender nada também, mas quem viaja com a cabeça aberta e prestando atenção ao redor entende que o mundo não é só o que a gente enxerga. E acho que a gente precisa entender que viajar não é necessariamente ir pra Europa ver museu ou ir aos EUA fazer compras. Dá pra viajar perto de casa, dá pra viajar gastando pouco e dá até pra viajar dentro da sua própria cidade também. Falo por mim: moro em São Paulo, que é uma das maiores cidades do mundo, e é sempre possível “excursionar” dentro da minha própria cidade, conhecendo bairros e lugares onde nunca fui antes. É uma das coisas que mais gosto de fazer.